15/06/2015

Privação

A primeira a ir foi minha vista.

Quando eu comecei a pensar no experimento, eu esperava que a última parte a parar de funcionar fosse a minha visão. Não tenho certeza se a droga diminuiu o funcionamento dos meus sentidos em uma ordem ou se foi aleatoriamente. Eu sabia que seria apenas temporário, mas me preparei para uma desconfortável, porém interessante parte da experiência. Eu sempre fui obcecado por privação dos sentidos desde que era mais novo, mas uma piscina cheia de cloro não iria me satisfazer. Eu queria alguma coisa que realmente fosse capaz de me privar dos meus sentidos, e consegui um sedativo experimental, ele supostamente deixava o corpo todo paralisado. Eu não costumava pesquisar muito sobre remédios que tomava antes de consumi-los, deixava apenas minha curiosidade me guiar, talvez até demais.

Minha visão não parou imediatamente, mas começou a ficar turva, foi aí que comecei a analisar as coisas. Eu descreveria minha experiência com algo similar a pessoas cegas ou que enxergam apenas sombras de cores ou somente formas. Quando minha visão sumiu completamente, as cores que eu lembrava assumiram outras formas, ás vezes formas iguais a silhuetas de pessoas. Eu pensava comigo mesmo que deveria manter a calma, todas aquelas formas e imagens pareciam querer me invadir.

A próxima coisa a parar de “funcionar” foi minha audição. O que fez minha conversa comigo mesmo ficar completamente inútil, primeiro, eu achei que minha voz estava ficando mais fraca, mas eu percebi que outros volumes de músicas e sons caseiros estavam diminuindo, tão rápido quanto minha visão. Quando eu fiquei completamente surdo consegui ouvir apenas um som, ou apenas o que eu achava que era um som.

Existe um familiar som de sinos batendo que muitas pessoas com problema de audição afirmaram ter escutado, ás vezes em períodos curtos de tempo, outras vezes por dias. Considerei isso, mas dada a condição de surdez que eu me encontrava, conclui que aqueles sons estavam sendo criados pela minha mente. O barulho se intensificou depois de um tempo e logo ficou inconsistente, aparecendo esporadicamente e outras vezes com curtos intervalos de tempo o som se tornaria algo parecido com ruído de microfone.

Então eu presumi que o próximo a “falhar” seria meu paladar, apesar de não ter consumido nenhuma comida ou bebida recentemente, eu senti uma pequena mudança. Eu realmente perdi alguma coisa na minha boca, mas isso estava sendo ofuscado pela quantidade de ilusões que eu tive devido à perda da visão e da audição. Mais figuras estranhas continuaram aparecendo na escuridão dos meus olhos e depois de várias aparições, as mesmas pareciam se mover. O barulho nos meus ouvidos continuou crescendo cada vez mais, juntamente com seus intervalos e na minha cabeça estavam quase em sintonia com as formas que eu “enxergava” na escuridão.

Enquanto meus sentidos pareciam que estavam sendo arrancados de mim, eu percebi que mais um estava sumindo, o meu olfato; no entanto, assim como meu paladar, esse passou por mim quase despercebido, eu estava distraído demais com as figuras e barulhos que minha mente estava criando. Havia apenas uma figura naquele momento, começou a se mexer calmamente enquanto o barulho insuportável dentro da minha cabeça continuava. Eu nunca saberia o que é ser surdo se esses sinos malditos continuassem! Eu comecei a passar a mão em volta de onde eu estava, gritando por ajuda que eu não seria capaz de perceber a existência nem se estivesse parada a minha frente. A forma era alta, com algumas partes do corpo maiores do que outras, as pernas dela se balançavam e enrolavam enquanto ela andava, se mexendo de forma esguia enquanto eu encontrava o que parecia ser os olhos da mesma.

O último sentido a desaparecer foi o tato, e provou para mim o significado da palavra sofrimento. Eu podia sentir meu corpo se tornando invisível, e isso me fez despencar violentamente, me batendo em alguns objetos. Quando alcancei o chão, fiz de tudo para passar as unhas e os dedos no chão, tentando desesperadamente trazer meu tato de volta.

Depois de apenas alguns segundos, sem nenhum dos meus sentidos funcionando, os barulhos insuportáveis da minha cabeça diminuíram e se tornaram pequenos e calmos sussurros. Esses, assim como os sinos, começaram a ficar mais irritantes e mais altos toda vez que a figura da minha visão começava a se aproximar de mim. A única coisa que eu podia fazer enquanto ela se aproximava, era assistir, e quando estava apenas a alguns centímetros de distancia de mim, eu vi seu rosto.

No meio do meu sofrimento psicológico, eu tive a ideia estúpida e idiota de falar com aquilo. Perguntei o que era, e o que queria.

“Eu sou o que resta quando nada mais existe. Eu sou o que fica assistindo você enquanto você está distraído, cheio de coisas e imagens ao seu redor. Eu sou o que aparece raramente pra você, quando você se encontra desocupado demais e se convence que foi apenas sua imaginação. Eu espero pacientemente, ansioso pelo momento que sua alma será exposta, sem nenhum escudo para protegê-la.”

Os sussurros me convenceram de que minha audição havia retornado, que alguém na realidade da minha existência estava sussurrando nas minhas duas orelhas enquanto eu continuava a fitar aquela criatura assombrosa nos olhos. Ele começou a aproximar sua mão esguia do meu rosto, como se estivesse pronto para me tocar enquanto eu senti minha sanidade entrar em colapso, a forma começou a desaparecer e voltar para vazio, que agora, estava claro. Os sussurros e outros barulhos sumiram rapidamente.

Como se estivesse acabado de acordar depois de um pesadelo horrível, meus sentidos rapidamente retornaram á vida. Eu estava muito cansado, como se eu tivesse corrido em círculos por horas e horas seguidas. Meu corpo estava coberto de marcas e roxos; eu suava como um porco enquanto tentava regularizar minha respiração.

Havia acabado. A pílula era realmente temporária. Olhei para o relógio, tentando lembrar à hora exata que comecei o experimento e percebi que todos os acontecimentos haviam durado apenas quatro minutos, como as pesquisas feitas sobre o medicamento haviam comprovado.

Passei as próximas horas do dia tentando me recuperar, ainda perturbado pelo que eu havia visto. Eu estava supostamente “salvo”, mas eu ainda sentia como se estivesse sendo ameaçado de alguma forma enquanto eu tentava lembrar o que havia acontecido detalhadamente. Tentei justificar tudo aquilo como se fosse obra da minha imaginação; perder os sentidos havia me deixado paranóico e eu teria imaginado uma sombra gigante que simplesmente sumiu quando a medicação  parou de fazer efeito.

No entanto, o que eu não consigo esquecer são as palavras. As palavras que ele falou. A coisa havia ido embora por que meus sentidos o haviam bloqueado? Eu só desejo nunca ter feito aquela pergunta. Queria ter ficado em silencio, eu simplesmente passaria por esse evento e me convenceria de que era culpa da minha privação, teria me convencido de que aquela coisa havia sido criada e destruída pela minha mente.

Eu quero me convencer disso, mas não consigo. Toda vez que penso sobre aquilo, eu só consigo imaginar a criatura na minha frente, invisível, esperando que meu corpo morra e minha alma se torne alvo dele, virando apenas destroços.


E agora presto mais atenção nas figuras que vejo quando fecho os olhos, enquanto algumas são aleatórias e outras tomam forma familiar de distorcida figura. 

9 comentários:

  1. vou criar um grupo de creepy no whats caso queiram entrar chamem nesse numero +33758678554 gogo

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Vò até ligar o rádio e a luz aqui do quarto depois disso
    Vai que um tiuzinho maluko tenta lega minha alma

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  4. "Eu sempre fui obcecado por privação dos sentidos desde que era mais novo.." WTF?! Que tipo de pessoa é obcecada em privação de sentidos???
    Boa creepy

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  5. Era o slender mudando de profissão '<'

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