29/03/2020

Alguém observa através do espelho


Nos últimos 4 anos, morei em um apartamento no centro da cidade, mas desde que minha amiga Lisa voltou para o seu estado natal, fiquei em má condição financeira e não consegui pagar o aluguel sozinho por muito tempo. Tive que me mudar para uma área mais afastada da cidade, onde o preço dos aluguéis estivessem no mesmo patamar que o meu estado financeiro. O lugar em questão para onde me mudei foi uma cidadezinha nos arredores de Luisiana, onde consegui arrendar uma casa com um bom custo-benefício.

Assim que a assinei o contrato com o proprietário da casa, mudei-me uma semana depois. Embora a casa tivesse sido reformada há pouco tempo, dava para notar claramente que era uma construção antiga. Fora isso, estava de bom tamanho e atendia às minhas necessidades básicas.

Levei meus poucos pertences para a nova moradia e, depois de organizar tudo, caminhei pelo domicílio e procurei me aclimatar com o novo ambiente. A casa em questão era pequena, com dois quartos, um banheiro e um porão.

Depois de andar e verificar toda a casa, uma das primeiras coisas que notei foi que não havia espelhos em nenhum dos cômodos. E como sou um cara bastante vaidoso, teria que comprar um. E foi o que fiz no dia seguinte. Saí explorando a pequena cidade em busca de um espelho. Andei por cerca de 30 minutos e não estava encontrando nenhum lugar que parecesse ter o que eu queria. Já estava ficando cansado e pensando em voltar para casa, mas caminhei mais um pouco e foi quando avistei, de longe, o que parecia ser algum tipo de bazar, com produtos novos e usados.

Chegando lá, encontrei uma velha senhorinha, que parecia ter origem cigana. Ela estava sentada atrás de um balcão. Iniciei uma conversa, cumprimentando-a:

— Olá! Boa tarde.

E antes mesmo de eu abrir a boca novamente para dizer o que estava procurando, ela apontou para dentro do estabelecimento e disse, com uma voz rouca:

— O que você procura está nos fundos da loja.

Fiquei surpreso e espantado quando caminhei até o fundo da loja e encontrei um espelho de tamanho médio, apoiado sobre alguns tapetes velhos no chão. Peguei o espelho e apenas levei em direção ao balcão sem dizer nenhuma palavra. Ela o embrulhou em alguns papéis castanhos, fiz o pagamento e saí da loja perplexo e sem entender nada.

Carregando o espelho, caminhei de volta para casa, e quando cheguei em frente, me deparei com um senhor de idade. Ele parecia estar apreciando a velha construção recém-reformada. Então, fui falar com ele.

— Olá, boa tarde! O senhor precisa de alguma ajuda?

— Você mora aqui? — ele me perguntou, ignorando completamente minha pergunta.

— Sim, faz poucos dias que eu me mudei para cá!

— É uma bela casa, não é?

— Sim! O senhor mora por aqui?

— Eu já morei nessa casa anos atrás! Bem, meu nome é Marty McFly. E o seu, rapaz?

— Eu me chamo Rick!

— Prazer em conhecê-lo, Rick! — apertamos as mãos.

— E o que você carrega embaixo do braço, filho?

— Isso é só um espelho que acabei de comprar. Bem, já que o senhor morou aqui há um tempo, não gostaria de entrar para ver como ficou a reforma por dentro?

— Sim, claro! Seria um prazer! Vou poder relembrar o que passei nesta casa.

Então, caminhamos em direção à porta da frente. Assim que chegamos, peguei as chaves e abri a porta. Entrei primeiro; logo após, o senhor McFly perguntou:

— Com licença, posso entrar?

— Claro, fique à vontade!

Então, ele entrou. Eu lhe mostrei toda a casa e nós conversamos o resto da tarde, tomando um bom café enquanto ele me contava as histórias de quando morava ali. Em algum momento, ele olhou seu relógio e disse:

— Já é tarde, eu preciso ir!

— Tudo bem, acompanho o senhor até a porta!

Abri a porta. Ele saiu e caminhou até a calçada. Quando parou, virou-se e disse:

— Até logo! Foi um prazer conhecê-lo, Rick! Esta sempre foi uma bela casa!

— Obrigado! Até logo, senhor McFly!

Depois disso, o Sr. McFly foi embora, caminhando lentamente.

Fechei a porta e, logo em seguida, fui procurar por um prego e um martelo para pôr o espelho na parede do meu quarto. Feito isso, já estava escurecendo e fui para o banheiro, tomar um bom banho. Meus planos naquela noite eram apenas relaxar e gastar o tempo vendo alguns filmes de ação. Algumas horas se passaram e eu já estava ficando com sono, então desliguei a TV e fui em direção ao meu quarto.

Cheguei à porta e comecei a caminhar em direção à cama. Durante o momento que passei em frente ao espelho, com o canto dos olhos pensei ter visto uma sombra desfocada, como uma névoa negra que flutuava do outro lado. Rapidamente me virei para poder ver melhor, mas não havia nada lá, apenas o reflexo de mim mesmo. Não me importei muito; apenas pensei que fosse coisa da minha cabeça, já que eu estava com bastante sono. Então, fui dormir.

Na manhã seguinte, levantei e fui até a porta da frente para pegar o jornal, reparando que a grama estava bastante alta. Decidi que, depois do café da manhã, iria cortar a grama. Tomei café, li o jornal com as últimas notícias e, logo após, desci até o porão para pegar um velho e empoeirado cortador de grama. Subi as escadas e fui até porta da frente. Quando a abri, tive uma surpresa: o Sr. McFly estava parado em frente à minha casa novamente. Saí até a varanda e o cumprimentei:

— Bom dia, Sr. McFly!

— Bela casa!

E ele foi embora, caminhando lentamente, sem dizer mais nada. Achei aquilo estranho, mas não me importei muito, já que eu tinha um trabalho para fazer e logo iria chegar uma forte tempestade.

Algumas horas se passaram. Assim que eu havia terminado de aparar a grama, a tempestade chegou; o céu escureceu e uma forte chuva parecia varrer o chão. Peguei o maquinário e levei para dentro de casa. Fui em direção ao porão para guardar todo o material, mas assim que abri a porta e acendi a lâmpada, notei um forte brilho de algo que resplandecia a luz elétrica. Coloquei a mão em frente aos meus olhos para que a luz refletida não atrapalhasse minha visão e desci as escadas até o brilho intenso.

Quando me aproximei, não acreditei no que eu estava vendo. De alguma forma, o espelho havia ido parar no porão, exatamente no lugar onde estava o cortador de grama. Sem entender nada, parei por alguns segundos e pensei se teria sido eu quem, em algum momento, teria o levado até aquele lugar. Confuso, peguei o espelho, subi as escadas e fui em direção ao meu quarto. Chegando lá, segurei-o à minha frente e coloquei-o na parede. Assim que tirei as mãos do espelho, a sombra apareceu do outro lado como um flash de luz negra. Meu corpo tremeu em medo e paralisou instantaneamente. Fiquei em paralelo com a sombra. Sua forma, agora, era diferente de quando vi com o canto dos olhos na primeira vez: ela parecia mais nítida, como se sua forma houvesse se condensado. Ela pôs o que parecia ser sua mão para fora do espelho, avançando em direção ao meu peito, e, depois, retornou lentamente, como se estivesse puxando todas as minhas energias. Minha visão escureceu e eu caí no chão, desmaiado.

No dia seguinte, um rápido flashback com tudo que eu havia passado percorreu minha mente e acordei em pânico. Estava ofegante e suando frio. Olhei em volta e tudo parecia normal; eu estava em minha cama, com as roupas que eu geralmente uso para dormir. “Será que tudo foi um pesadelo?”, perguntei para mim mesmo. Me levantei e encarei o espelho. A única coisa que apareceu foi o reflexo do meu rosto com uma expressão de não estar entendendo nada. Dei uma volta pela casa e tudo parecia estar em seu devido lugar. “Devo estar ficando louco”, foi isso o que eu disse enquanto ria de mim mesmo.

Decidi ir ao mercado fazer compras naquele dia. Talvez eu só precisasse ocupar minha mente com alguma coisa. E foi isso o que fiz. O dia passou e voltei para casa à noite, com todas as coisas que eu havia comprado. Organizei tudo e, logo após, tomei um banho de água quente. Me sentia exausto, como se tivesse corrido uma maratona. Então, fui para cama e desabei.

Eram por volta das 10 da manhã quando acordei com batidas na porta. Minha amiga Lisa, que antes dividia o apartamento comigo, estava de passagem pela pequena cidade e teria vindo me visitar. Eu a abracei muito e convidei-a para entrar. Fiquei feliz que ela tivesse aparecido — realmente precisava de alguém para conversar, e Lisa e eu somos bastante próximos, já que nos conhecemos desde a infância.

Passamos o dia inteiro conversando e relembrando os melhores momentos da nossa infância. A noite havia chegado e Lisa perguntou se ela poderia dormir na minha casa, naquela noite. Respondi que sim. Claro que ela poderia. Afinal, somos velhos e bons amigos e não teria mal algum. Então, preparei o outro quarto para que ela pudesse ficar à vontade. Demos boa noite um ao outro e cada um foi para o seu quarto dormir. No outro dia, acordei um pouco cedo e preparei o café da manhã antes de que ela acordasse.

Fiquei esperando Lisa acordar por quase uma hora e o café já estava esfriando, então decidi ir até o quarto onde ela estava para acordá-la. Quando cheguei lá, me deparei com o quarto vazio. Lisa havia ido embora mais cedo e eu não pude me despedir e agradecer por sua visita. Então, peguei meu celular e a liguei para agradecer:

— Alô! Lisa?

— Sim, Rick! Como está você?

— Estou ótimo, só liguei para lhe agradecer pela visita de ontem!

— Visita de ontem?

— Sim! Fiquei muito feliz por você ter vindo me visitar. Eu realmente precisava de alguém para conversar um pouco.

— Rick, eu ainda não o visitei desde que você se mudou para sua nova casa. Estou a quilômetros de onde você mora e ter te visitado ontem seria impossível.

— Mas... é... você... você veio... desculpa, foi só uma brincadeira. Só liguei para saber como você está. Tenha um bom dia, Lisa.

— E como você...

Desliguei o telefone antes de que ela pudesse terminar sua fala. Voltei ao quarto que eu havia preparado para Lisa passar a noite e tudo parecia em ordem.

“Então, tudo isso foi um tipo de ilusão? Será que ainda estou sonhando?”

Foi isso o que me perguntei durante algumas horas. Talvez eu estivesse chegado ao ápice de minha loucura e acabei decidindo que precisava de um médico. Por sorte, a empresa onde trabalho cobria um plano de saúde no qual os médicos atendem a domicílio 24 horas. Então, eu não precisava ir muito longe. Peguei meu celular e rapidamente liguei e agendei uma consulta a domicílio. Os únicos horários vagos disponíveis naquele dia eram durante a noite. Agendei assim mesmo, só precisando segurar as pontas até o médico aparecer.

Durante o fim de tarde daquele dia, eu saí de dentro de casa e sentei-me na varanda para pegar um ar. Passados alguns minutos, vi uma silhueta de um homem ao fim da rua, caminhando lentamente em minha direção. Eu não consegui identificar de início, já que o sol da tarde estava contra a minha visão. Então, apenas o observei chegar mais perto e mais perto, até que finalmente chegou e parou em frente à minha casa. Meus olhos foram se ajustando à luz enquanto eu o olhava dos pés à cabeça. Assim que meus olhos se ajustaram completamente, pude ver que era o senhor McFly ali, parado na calçada novamente. Ele observou por alguns segundos mais uma vez a casa e disse:

— Bela casa.

Em seguida, saiu caminhando sem dizer mais nada, como ele sempre fazia. Observei sua silhueta perante a luz do sol, se afastando, até que se cobriu completamente o fim da rua. Talvez o senhor McFly só estivesse caminhando pelo bairro, mas eu não conseguia entender sua obsessão por minha casa. Não me importei, apenas pensei que, com sua idade avançada, suas condições mentais não estivessem indo bem.

Fiquei ali, sentado o resto da tarde, e observei o cair da noite. Minha consulta estava agendada para as 20 horas, mas já haviam se passado duas horas desde o horário marcado. Pensei que o médico tivesse sofrido algum tipo de acidente ou ele houvesse tido algum problema. Então, resolvi não esperar mais, já me preparando para dormir. Foi quando, de repente, ouvi batidas na porta. O médico finalmente havia chegado. Fui até a porta e o convidei para entrar.

Eu o contei tudo pelo que havia passado nos últimos dias. Ele me examinou por alguns minutos, e, depois, se afastou de mim. Foi até sua bolsa e misturou alguns medicamentos, preparando, assim, uma injeção. Ele falou que seria necessária a aplicação dos medicamentos no braço esquerdo. Fiz o que ele mandou sem questionar, já não estando em posição para isso. Minha sanidade não estava bem.

Assim que ele terminou de aplicar aquilo em minha veia, senti meu corpo ficando leve e minha visão escurecendo. Depois de poucos segundos, apaguei completamente. Acordei na manhã seguinte, sem saber qual era o horário do dia. Meu corpo parecia arder por dentro e por fora, então me levantei desnorteado e procurei o médico pela casa, mas não o encontrei. Caminhei em direção ao banheiro para tomar um banho gelado. Assim que tirei a roupa e entrei debaixo do chuveiro, a água caiu sobre meu corpo e eu vi o que parecia ser sangue escorrendo pelo meu estômago. Olhei para o meu peito e vi o que parecia ser um pentagrama desenhado com sangue, e, em cada ponta do pentagrama, havia uma cruz invertida. Comecei a esfregar meu peito com as mãos para tentar remover aquilo. Tentei muitas vezes, mas não obtive nenhum resultado. A marca continuou em meu mim.

Sem entender o que estava acontecendo comigo, saí do banho, enxuguei-me com a toalha e andei em direção ao meu quarto. Eu me sentia vazio e meu corpo não parava de arder. Cheguei em meu quarto e fui até o espelho para poder ver melhor aquela coisa desenhada em mim, mas, quando olhei para a parede, estava vazia e o espelho havia sumido. Então, comecei a andar por toda a casa, procurando-o.

Vasculhei todos os cômodos e já estava quase caindo de cansaço. Sentia meu corpo fraco. Foi quando me lembrei do único lugar que o espelho poderia estar... o porão. Fui até lá e abri a porta. Desci as escadas, fazendo muito esforço para não cair. E quando acendi a lâmpada... meu corpo tremeu. Havia um homem que estava de costas em meu porão... e ele disse:

— Esta é uma bela casa, não é mesmo?!

Claro que reconheci aquela voz... era o senhor McFly. Ele se virou lentamente e, em suas mãos, segurava o espelho. Pude ver que a mesma marca do meu peito também estava desenhada ao centro dele. Meu corpo rapidamente paralisou e minha visão escureceu. Caí ao chão, desmaiado novamente.

Uma rápida retrospectiva de memórias percorreu meu cérebro e, novamente, acordei em pânico e suando frio. Eu estava em minha cama, com as roupas que uso para dormir. Lembrei do que havia passado e, logo, levantei minha camisa para verificar se havia alguma marca em meu peito, mas não havia nada. Olhei para o espelho e ele estava lá, em seu devido lugar. Então, levantei e fui até a varanda, à frente da minha casa, para pegar um ar e pensar melhor.

Chegando lá, sentei-me nos degraus e comecei a pensar se tudo por que passara nos últimos dias teria sido real ou apenas uma ilusão. Fiquei pensativo por longos minutos, e não encontrei nenhuma resposta para acabar com a dúvida que pairava em minha cabeça.

Voltei para dentro de casa e a única coisa que se passava em minha mente era que o espelho fosse a fonte de tudo aquilo. Então, fui até minhas ferramentas no porão e peguei um martelo para colocar um fim em tudo isso. Fui até meu quarto e comecei dar marteladas no espelho. Depois de desferir uns cinco ou seis golpes, notei que nem chegou a trincar; eu batia com mais força e mais força. O espelho parecia indestrutível. Então, peguei meu cobertor e fiz o que parecia ser um tipo de embrulho. Saí de casa furioso para levar o espelho de volta para onde eu o havia comprado.

Chegando lá, encontrei novamente a velha senhorinha com traços ciganos, sentada atrás do balcão, fumando um cachimbo. Então, eu disse em tom de fúria:

Rick — Me livre disso, essa coisa só me trouxe problemas!

Assim que joguei o espelho em cima do balcão, ele se despedaçou.

Cigana — O que está acontecendo, meu jovem?

Rick — Essa coisa só me trouxe problemas! Deve ter algum tipo de feitiço.

Cigana — Impossível. Sou médium eu sentiria se o espelho estivesse envolvido com alguma magia.

Rick — Então, examine os pedaços! Essa coisa me fez passar por momentos que eu não sei se foram reais.

E assim que ela segurou um fragmento do espelho, seus olhos esbugalharam e ela deixou o fragmento cair ao chão, como se algo a tivesse assustado. Então, ela me lançou um olhar de espanto e perguntou:

Cigana — Onde você mora, meu rapaz?

Rick — Na velha casa recém-reformada, ao final da rua River.

Cigana — Você nunca deveria ter se mudado para lá. Naquela casa aconteceram coisas terríveis!

Rick — O que aconteceu lá...?! Me fale!

Cigana — Um homem se enforcou no porão da casa. Ele se matou depois de que se divorciou de sua esposa. As autoridades queriam que ele entregasse a casa para sua ex-mulher e filhos, mas se negou e falou que nunca entregaria, lançando uma maldição sobre a casa antes de se matar!

Rick — E qual era o nome desse homem...?

Cigana — Marty McFly!

Meu corpo tremeu em pânico quando ela terminou de falar. E eu disse:

Rick — Mas... é... é impossível. Eu conheci o senhor McFly e ele está vivo!

Ela me olhou novamente, com um olhar pasmo.

Cigana — Quando você o conheceu?

Rick — No mesmo dia em que comprei esse espelho. Ele estava parado na calçada, em frente à minha casa. Parecia estar a apreciando. Então, conversemos um pouco e eu o convidei para entrar; tomamos um café enquanto ele me contava suas histórias de quando morava na casa.

Novamente, um olhar de espanto.

Cigana — Você o convidou para entrar?!

Rick — Sim, ele parecia apenas um triste senhor com saudades da casa!

Cigana — Você nunca deveria tê-lo convidado para entrar. Não sabe que não se convida estranhos para entrar em sua casa?!

Rick — Mas... o que está acontecendo?!

Cigana — Nos últimos dias, quantas pessoas você convidou para entrarem em sua casa?

Rick — Foram três, mas não sei se foi real ou apenas uma ilusão.

Cigana — Quem foram as pessoas?

Rick — O senhor McFly, a minha amiga de infância, Lisa, e um médico que veio me examinar!

Ela olhou pra mim e seu corpo todo tremeu. Sua expressão era de puro pânico. E ela disse:

Cigana — O ritual está já deve estar completo...

Rick — Que ritual? Do que a senhora está falando?!

Cigana — O espelho que você comprou aqui, e que agora está em pedaços, foi o primeiro objeto pertencente a você que o McFly viu, certo?

Rick — É... é... sim!

Cigana — Ele usou o espelho como um portal para te observar e roubar suas energias enquanto o ritual se completava. Pela forma com que você jogou o espelho aqui, em cima do balcão, você já havia tentado quebrá-lo antes e não deu certo. Não é?

Rick — Sim... tentei quebrar com o martelo, mas parecia impossível. E quando joguei aqui em cima, pensei que não iria se estraçalhar.

Cigana — Bem... agora que o espelho está quebrado, isso só reforça minha teoria de o ritual estar completo.

Rick — Mas que ritual?!

Cigana — Venha aqui, meu rapaz. Chegue mais perto!

Assim que eu me aproximei, ela levantou minha camisa.

Rick — Ei, o que você está fazendo?!

Cigana — Seu corpo está ardendo?

Rick — Sim, não sei o que está acontecendo comigo. Mas como você sabe disso?

Cigana — Me deixe ver a marca em seu peito!

Rick — Como você sabe da marca?! Mas não importa, ela não está mais em mim!

Cigana — Se você não a vir, não quer dizer que eu não possa senti-la! Agora, chegue mais perto e deixe-me ver!

Então, ela colocou a mão em meu peito. Pude ouvir um barulho igual ao que um hambúrguer faz quando é colocado em uma chapa de metal quente.

Cigana — AAAAAAH...! Sim, o ritual está completo!

Rick — Mas que maldito ritual é esse?!

Cigana — O velho McFly é um espírito possessivo e demoníaco muito forte. Minha mãe, há muito tempo atrás, baniu-o da casa, mas não conseguiu bani-lo completamente desse plano. Esse foi o último trabalho de minha mãe antes de ela morrer. Desde então, uma parte do velho McFly vaga pelos arredores da casa, tentando, de alguma forma, voltar para dentro, onde seu poder fica muito forte e estará no ápice. Todas as pessoas que você convidou para entrar em sua casa eram o McFly, e em todas as vezes que você as convidou para entrar, ele se tornava mais forte, deixando a áurea protetora que minha mãe havia lançado sobre casa cada vez mais fraca. A primeira pessoa era o McFly, com sua aparência real de quando era vivo. Nessa fase, ele queria que você lhe concedesse a permissão para que pudesse entrar. Na segunda pessoa, ele veio disfarçado como sua amiga de infância. Nessa fase, sua intenção foi alimentar-se de todas as suas boas lembranças. A terceira e última pessoa foi o médico... a pior fase de todas.

Rick — Pior fase de todas?! Ande logo, me fale!

Cigana — Sim! Nessa fase do ritual, sua intenção foi roubar sua alma para que ele pudesse trocá-la pela parte dos seus poderes demoníacos, que estavam aprisionados no Inferno.

Rick — Que dizer que... minha alma está... está no Inferno?!

Cigana — Infelizmente, sim! A marca em seu peito e a marca no espelho que senti quando segurei o fragmento são a prova disso. O ritual está completo! E é por esse motivo que seu corpo arde tanto. Sua alma, agora, não faz mais parte deste plano. E assim que você morrer, seu espírito vai estar condenado à dor e ao sofrimento eterno.

Coloquei as mãos em minha cabeça cabeça, desesperado. Meus sentimentos se aprofundaram em pânico e meu corpo todo tremia. Não sabia o que dizer ou fazer; simplesmente estava acabado. E disse:

Rick — Mas isso é impossível! E agora, o que podemos fazer?!

Cigana — O espírito demoníaco do velho McFly está com 100% dos poderes, nunca estando tão forte quanto agora. Lamento, filho; seu destino já está traçado e não há nada que você possa fazer...

Autor: Vhulto

28/03/2020

Tocados por Satã

PARTE 1

Estamos no quarto, mal conseguimos respirar. Temos medo. Medo de chamar atenção. O melhor é ser invisível. Olho para Pedro. Ele se esforça para parecer impassível. Ele não gosta de demonstrar qualquer emoção. Não sei o que ele pensa. Se está arrependido de ter vindo para cá.

- Mãe ... - diz a voz estridente de Joana.

- Xiiii! Já disse que não é para falar - Sussurro para ela. Olho em seus olhos e na direção das três outras crianças que me olham assustadas. Ninguém diz mais nada.

Do lado de fora ouvimos gritos, pedidos de ajuda. Não nos mexemos. Mal respiramos. Só quero ir embora daqui, o que eu preciso fazer....

Meus pensamentos são interrompidos por uma batida na porta. Uma após outra a batida continua. Ouvimos a voz de Joaquim. Pedro se levanta, trocamos um olhar e ele vai até a sala. Tranco a porta do quarto. Na minha mente vem as imagens de tudo que aconteceu no dia anterior. Sinto medo. Todos nós trememos. Olho no quarto e coloco as crianças debaixo da cama. Isso é tudo que posso fazer para protegê-los.

Encostada na porta ouço vozes e logo os dois saem.

***

O que está acontecendo em Mourinhos é algo único, isso é certo. É impossível não reconhecer isso. Pedro viu com seus próprios olhos quando Joaquim ressuscitou a Eva, esposa de Lauro, seu primo. Pedro viu Joaquim fazer Sebastião voltar a enxergar. Ele sabe que é graças a Joaquim que as colheitas estão sendo abençoadas. Então porque Pedro sente que a algo de errado? Joaquim sempre diz que tudo tem seu preço, que é preciso se dedicar de todo corpo e alma e que Deus irá recompensar isso. Mas parece que o preço está sendo alto demais ultimamente.

Finalmente eles param de caminhar. Chegaram.

Pedro se lembra do dia que chegou em Mourinhos. Se lembra de quando ele próprio abriu espaço em meio a mata, para poder construir aquilo que se tornou a igreja. Olha pro chão de terra e vê as três trilhas. Uma de Mourinhos, outra Ubiracaba e a terceira de S. João Negro, os três pequenos vilarejos que se deslocavam toda semana para assistir os cultos ali. Pedro preferia pensar nessas coisas ao invés de focar no que estava acontecendo na sua frente.

Algumas pessoas estão gritando e outras chorando, mas a maioria permanece calada. Manuel e Carlos seguram Leila pelos braços.

- Hoje é dia de purificar! - Joaquim grita - Por que amanhã o Senhor vem!

É sabido que Leila havia sido tocada por Satanás, Dulce havia visto o demônio entrar no corpo da jovem. Eles querem salvá-la. Pedro pensa e fica repetindo isso para si mesmo.

Ela é deitada, nua no chão e é alvo de vários pontapés. Joaquim sobe por trás dela e começa apertar o seu pescoço, diz que o diabo irá ter que sair, mas não é fácil, ele é muito ardiloso.

Carlos diz para as pessoas começarem a orar e elas oram. Pedro olha para aquilo, mas não acredita que está acontecendo de verdade.

A garota para de se mexer. Está desmaiada ou morta. Algumas pessoas gritam, mas logo se calam quando Carlos e Manuel as empurram para frente.

- Devemos nos preparar irmãos... O diabo anda rondando procurando quem possa tragar. Devemos nos manter firmes, vigilantes e procurar purificar nosso corpo e alma.

Dona Dulce vai para o centro do lugar e repete a revelação que havia tido no dia anterior.

Pedro continua parado em frente a única porta do local, de guarda.

- Cadê Priscila? - pergunta João.

Pedro não responde, parece que perdeu a capacidade de falar. Sua mente está atordoada por tantos pensamentos. Olha para o corpo de Leila, definitivamente ela está morta. Acima de tudo sente culpa. Culpa por ter desonrado aquela garota, por ter traído sua esposa... Por não ter impedido a morte dela. Lembra de Leila, dos seus encontros escondidos. De seus beijos, seus toques... Agora ela estava morta. Seus pecados também são muitos e ele sabe que Joaquim estava tentando salvar a alma dela, expulsando o demônio. Ele prende a respiração. O que é isso que está sentindo? Dúvida, ele diz para si mesmo após pensar um pouco.

Seus pensamentos se dispersam com a gritaria mais a frente. Uma mulher com bebê no colo grita. Joaquim tenta tirar o bebê dos braços dela, outro homem está jogado no chão, sangrando. A mulher grita. Dulce começa a orar, quase gritando, pedindo forças a Deus, para continuarem perseverando. O bebê é arremessado, começam a bater na mulher sem parar. Sem parar para pensar, Pedro corre para longe dali.

***

A porta de casa se abre de uma só vez e Pedro entra.

- Priscila!

Saio do quarto correndo do quarto, vou até ele e o abraço.

- Vamos sair daqui - ele diz - ir embora desse lugar.

Me surpreendo tanto que levo alguns segundos para responder.

- Mas você...

- Eu sei tudo que já disse. Não sei se dá tempo de arrumar as coisas, pega as crianças e vamos sair...

- Temos que ir a cidade - digo - chamar a polícia.

- Sim, sim, mas vamos logo!

Corri para o quarto.

- Vamos! Sai de baixo da cama, quietos!

Os quatro saem e ficam olhando para mim. Eles estavam ontem na clareira...

Josué começa a chorar e logo os outros estão chorando também. Não tenho tempo para isso. Empurro eles em direção a sala. Pedro pega as duas meninas e eu agarro os meninos pelo pulso...

- Pedro - ele olha para mim e continuo - isso não vai dar certo. É melhor um de nós dois ir e chamar a polícia. Melhor eu ir. Você fica aqui e se perguntarem por mim diz que estou doente ou fugi, não sei. Eu volto com eles.

Não vamos conseguir correr com essas crianças e pior se formos pegos...

- Você não conhece o caminho pela mata - ele diz - só o da trilha e se for pela trilha eles vão te achar rápido.

Paramos de falar. Precisamos prestar atenção se há alguém em volta. Vamos até a janela, mas é claro que não há ninguém andando... estão todos escondidos. Saímos. Corremos em direção a mata. Quando chegamos já estou sem folego. Andamos até o cair da noite. Tento não pensar nos animais que podem ter ali, Pedro está acostumado a entrar na mata, caso apareça algum bicho ele pode nos proteger.

Acabamos parando e sentando para descansar.

- To com fome! - reclama Maria.

- Vai ter que esperar um pouco, falta pouco pra gente chegar na cidade.

Minha mente voa enquanto olho para Pedro. Durante todo tempo que moramos em Mourinhos, sua fé no profeta Joaquim era inabalável. Nossa vida juntos se resumia em promessas e arrependimentos. Não sei porque ele decidiu fugir. Não sei se vamos conseguir chegar na cidade e denunciar, se Joaquim vai ser preso ou vamos acabar mortos. Sei que eu nunca deveria ter aceitado vir para cá, junto com ele. Me lembro do dia em que ele chegou dizendo sobre vir para Mourinhos, sobre ficar aqui uns tempos, ganhar dinheiro suficiente para abrir uma lojinha na cidade. Achei besteira, mas a ideia não saia da cabeça dele e de tanto insistir acabei pensando que talvez fosse uma boa ideia. Bem, isso foi uma péssima ideia.

***

Pedro percebe quando Priscila caí no sono, ele não consegue parar de olhar para ela. Fica feliz por ela não ter ido até a igreja pela manhã, não ter visto toda aquela violência. O que aconteceu na clareira já foi demais para ela e para as crianças também. Não conseguia parar de pensar em Leila, mas não de uma forma romântica. Seu corpo ensanguentado não saia da sua cabeça e sentia como se fosse cúmplice do seu assassinato, já que não tinha feito nada para impedir.

Assassinato

Agora que havia se afastado da aldeia podia pensar claramente. Via como Joaquim estava usando aquela desculpa de purificação para matar Leila. O povo falava que os dois estavam para se casar... Deve ter descoberto que ela não era mais virgem, ela contado sobre o caso dos dois... Por isso havia sido chamado a igreja naquela manhã.

Isso só não explica todo o resto. A purificação não começou com Leila, havia começado no dia anterior, na clareira. Uma parte da mente de Pedro não queria pensar que o profeta estava usando de artimanhas mesquinhas para fazer sua vontade, que as visões de Dulce iriam acontecer e aquilo era realmente necessário.

Não sabe em que momento dormiu. Acordou com barulho de vozes e passos. Levantou e acordou Priscila e as crianças. Correram. Só conseguia sentir raiva, não deviam ter parado, deviam ter seguido até achar a cidade, agora estavam perdidos. Corriam sem rumo, mata a dentro, com homens bem atrás deles. Agora conseguia ouvir as vozes claramente. Quando estava tentando identificar de quem era aquela voz, sentiu uma pancada na cabeça e tudo se apagou.

PARTE 2

Estavam amarrados, jogados no quanto de uma sala. Carlos tomava conta para que não fugissem. Ele era um antigo conhecido da família, foi ele que convenceu Pedro a largar tudo na cidade e vir para o meio do nada, para um lugar que os faria ricos. A riqueza não chegou, nem de longe, e agora Carlos se virou contra eles. Parecia pronto para matá-los, se fosse necessário.

A pancada que levou, eles a jogarem do alto e também as cordas, tudo isso fazia com que seu corpo sentisse muita dor, mas não pensava nela naquele momento, pensava nas crianças. Elas estavam encolhidas, abraçadas. Olhavam com olhos arregalados, esperando por alguma resposta que Priscila não podia dar. Devem estar com fome, pensou. Com sede, com medo... Não poder fazer nada a deixava arrasada.

Me viro na direção de Pedro apenas para ver o vazio.

***

Irmão Manuel falou que tem um demônio em sua casa, na sua filha. Ele mesmo foi correndo até o profeta pedir sua ajuda. O que aconteceu um pouco mais cedo não sai da minha mente, eu não consigo deixar de ver por um segundo. Isso explica o que estou fazendo aqui, numa clareira no meio da floresta, queimando o corpo de Amélia, filha de seu Manuel. Eu vejo a gente chegando em sua casa. Dona Dulce na frente, Joaquim atrás dela. Eu e outros fomos também, Joaquim disse que fazia questão da minha presença ali. Não consigo deixar de ouvir seus gritos, e agora o cheiro de sua carne queimada está em todo lugar.

Estou quase vidrado olhando para o fogo quando começo ouvir vozes. Me concentro, tentando entender e quando consigo, sinto meu coração gelar. Eu e Sebastião nos entreolhamos.

- Vai demorar horas até terminar... é melhor eu ir indo na frente, preciso saber o que está acontecendo.

Virei as costas e sai. Quando estava do alcance de visão de Sebastião comecei a correr.

***

Tivemos um pequeno momento de paz antes de tudo recomeçar. Assim que a gritaria, que depois percebi que vinha da casa de Seu Manuel passou, ficou um silêncio enorme. Aquele tipo de silêncio onde todos parecem prender a respiração e aguardar por algo que vai acontecer.

Algumas horas depois, quando eu fui acordada do meu cochilo. Joaquim estava do lado de fora, ele e outros convocavam a todos a saírem para a rua porque o momento havia chegado.

O momento chegou.

Meu coração se acelera enquanto falo na minha voz mais tranquilizante, dizendo que vai ficar tudo bem, que logo isso tudo vai passar.

Quando vejo Carlos desamarra a corda que prende minhas pernas. Por alguns segundos tenho esperança que ele vai dizer para eu fugir, correr o máximo que posso, mas não é isso que acontece. Ele me puxa pelos braços e me põe de pé, faz o mesmo com as crianças.

- Vamos, ande!

Caminhamos para a porta e saímos. Quase todas as famílias estão do lado de fora de suas casas. Olho com atenção e percebo que em várias, faltam pessoas, algumas fugiram, outras estão mortas. Todos olham para nós. Logo começa uma celebração, hinos são cantados. Apesar de tudo parecem estar gratos, ansiosos. Devem pensar que há um custo a se pagar, mesmo que alto irá valer a pena. Queria tanto acreditar nisso! Seria muito mais fácil. Eu consigo ver alguns olhares céticos, mas que logo são disfarçados. Não sou a única pessoa a desconfiar de Joaquim, mas apenas eu e minha família fomos presos e amarrados por isso.

- Nos últimos dias nos preparamos. Nossa querida irmã Dulce teve uma visão, que todos já conhecem, mas quero falar novamente, os detalhes precisam estar bastante acesos em nossos corações para não restar dúvidas que todo nosso sacrifício não é em vão. Irmã Dulce viu, bem ali na Clareira, um anjo do senhor. Ele disse para ela que dali a três dias, nós iríamos subir aos céus, mas antes disso tínhamos que nos purificar. Tirar de nosso meio todo aquele que havia sido tocado por Satã. Ele nos disse sobre os sacrifícios finais, aqueles que seriam feitos no dia e que iriam chamar atenção de nosso Senhor. Durante algum tempo refleti sobre isso, tentando entender, mas logo a resposta surgiu diante de meus olhos. Então, irmãos, devemos caminhar, louvando e agradecendo. O momento tão esperado chegou!

Enquanto Joaquim falava, algo me chamou a atenção: Pedro.

Ele acabou de chegar. Não vem em nossa direção, continua parado ao longe olhando para nós. Minha dor agora não é apenas física. Esperava que quando ele chegasse viesse correndo para mim, tirasse essas cordas que me prendem... Foi apenas uma esperança idiota.

Joaquim continua falando, mas não presto mais atenção. Só percebo que nos empurram para frente, começamos a andar. Joana tropeça em suas pernas e caí, rala seus joelhos e começa a chorar. A puxam pelos bracinhos, é colocada de pé e volta a caminhar, mesmo mancando. Vamos na frente, o resto das pessoas atrás. Sei exatamente para onde estou sendo levada. Vamos para a clareira, o lugar onde começou tudo.

***

Não posso. Parar. De. Correr.

Não posso, nem por um minuto, é tudo que consigo pensar.

Meu corpo não me obedece. Começo a ficar com falta de ar, minhas narinas ardem. Abandonei aqueles que mais me amavam, aqueles que dependiam de mim. Quando vi minha esposa e as crianças amarrados como criminosos, senti uma vontade enorme de correr para desamará-los e fugir, mas eu sabia que isso nunca daria certo. Nunca conseguiria chegar perto deles e muito menos fugir dali, com todas aquelas pessoas sendo verdadeiros soldados de Joaquim. Sei que agi certo, aquela foi a única oportunidade, mas mesmo assim me sinto horrível. Acabo cedendo e descansando por alguns minutos. Respiro fundo. Tento pensar no que vou falar quando chegar na cidade, mas não consigo raciocinar com clareza, tudo se confunde em minha mente. Fecho os olhos tentando me concentrar e vejo o rosto de Priscila, de Joana, Josué, Maria, e Miguel. Vejo também Amélia gritando, pedindo pela sua vida. Lembro de Leila e da culpa de ficar com ela e de vê-la morrer e não fazer nada para tentar impedir. Aqui estou eu fazendo isso de novo. Me levanto, os pensamentos estão perigosos demais, se não me levantar agora e continuar, posso nunca mais conseguir.

***

Olho para os rostos ao redor. Todos cantam, com suas mãos estendidas para o céu.

- Devemos entregar nossos corpos como sacrifício vivo - diz Joaquim.

Olho de rosto para rosto.

- Joaquim, por favor! São crianças!

- Silêncio! - alguém me diz e sinto um tapa no rosto. É tão forte, o sangue escorre pela minha boca. Continuo pedindo pela vida deles, até que recebo um chute que me faz curvar. Fico sem ar por alguns segundos.

- O momento final chegou, irmãos - Joaquim repete.

Parece que toda voz foi tirada de mim. Não consigo gritar ou correr, só fico encarando todos com um olhar bestificado. Digo a mim mesma que deve ser um pesadelo, coisas assim não acontecem de verdade. Dou um último olhar para as crianças que estão sendo seguradas por pessoas da congregação. Fico com lágrimas nos olhos ao ver que ao contrário de mim elas são bastante valentes. Lutam com todas as forças para sair, gritam ameaças e chamam meu nome. Querem me libertar daqui.

Sou colocada deitada em uma pedra, cordas prendem meus braços e pernas a árvores.

A pregação continua.

- O preço é sim muito alto, mas a recompensa será ainda maior.

Então todos deram as mãos e por alguns instantes ninguém falou nada, o silêncio era quebrado apenas pelos gritos das crianças.

Então Joaquim começou a orar.

Penso em Pedro, na saudade imensa que sinto dele, na segurança que sinto toda vez que estamos juntos, por mais difícil que a situação esteja. Mesmo sabendo que é melhor ele não estar aqui, eu só consigo pensar no quanto queria ver ele uma última vez. Queria poder ver as crianças crescerem livres, bem longe daqui. Queria tanto viver! Me sinto arrependida, penso que poderia ter lutado mais, ter fugido antes dali, em alguns segundos muita coisa se passa pela minha cabeça, até que tudo se evapora.

A oração acabou. Dulce caminha em minha direção com uma facão. Começo a me debater, mas não consigo sair do lugar. Não vejo acontecer, apenas sinto. Meu pescoço arde, vejo meu sangue saltar em jato. Achei que iria doer mais. Meu coração se acelera pela última vez. Começo a sentir meu corpo cada vez mais fraco.

PARTE 3

Estou aqui no lugar onde tudo começou. A purificação. Não sinto medo, raiva ou qualquer outra coisa, não fui nem mesmo surpreendido com o que vi. Olho ao redor e vejo os rostos de meus vizinhos e amigos.

Minha esposa está presa, amarrada numa pedra. Ela está pálida, sem cor. Gelada. Seu sangue está no chão a sua volta. Vejo outros quatro altares de pedra ao seu redor. São menores do que o dela. Ao redor deles estão todos os outros, caídos no chão. Pendurados em árvores vejo Joaquim e Dulce.

Todos estão mortos.

Todos.

EPÍLOGO

"Hoje, o suicídio coletivo da comunidade de Mourinhos completa um ano. Preparamos um documentário especial sobre o caso que mais chocou o país."

Desligo a tv. Andressa aperta meu braço como que para mostrar que está ali comigo.

- Eu fico tão triste quando penso em tudo que você passou! - ela me diz.

Não foi fácil mesmo. Perder minha esposa, meus filhos de uma forma tão trágica, foi horrível.

- Tudo bem... Eu sei que fiz tudo que pude, espero que eles estejam com Deus agora.

Ela balança a cabeça concordando.

Fico feliz de, apesar de tudo, ter encontrado uma garota tão boa quanto ela, que tem me ajudado a superar tudo. Respiro fundo e ligo novamente a televisão. Vejo meu próprio rosto na tela.

"Decidi escrever esse livro como uma forma de desabafar, de contar ao mundo o que realmente aconteceu, jamais minha intenção foi a fama ou ganhar dinheiro em cima da morte da minha família, como muitos me acusam. Fico feliz que as pessoas tem se interessado pelo que aconteceu e espero honrar a memória de minha falecida esposa e dos meus filhos e que eles nunca sejam esquecidos."

O lançamento do livro foi planejado para um mês antes do aniversário da tragédia, segundo o agente isso iria chamar mais atenção. O livro Mourinhos - Relato sobre o maior suicídio coletivo do Brasil, se tornou um grande sucesso, logo entrando para listas de mais vendido no país.

Me levanto e vou até o lado de fora. Sento num banco. Por alguns instantes me permito pensar nas crianças, que iriam adorar brincar, correr por todo aquele quintal enorme e subindo nas árvores, em Priscila que estaria ali também, inventando alguma brincadeira e me chamando para perto. Não, essas lembranças são mortais. Se eu decidi viver tenho que seguir adiante, custe o que custar.

Autora: Anne Lopes

27/03/2020

O coronavírus mostrou que o apocalipse não era como nós esperávamos

Recordo quando eu tinha dez anos, foi semana passada o meu aniversário, tudo parecia bem. Mas, as pessoas começaram a falar sobre uma coisa acontecendo, as notícias focavam apenas em uma doença e todos estavam preocupados com o vírus. Os programas infantis e escolas que, aos poucos estavam sendo interditadas, anunciavam sobre o 'coronavírus'. Eu era uma criança e não me importei muito até que finalmente tudo se espalhou como se fosse uma emanação de medo. O meu pai apareceu durante à noite, acordando todos nós. Não sei bem o que falar sobre ele... Eu sempre vou ver como uma pessoa calada, com o rosto negro, pois nunca falava quando não era necessário. A sua forma de demonstrar amor pelos seus filhos, era quase vazia. Apesar disso, era o suficiente para nós e por alguma razão, a minha mãe o amava muito. O velhote trabalhava sempre com entregas, um caminhoneiro dedicado e um caçador nato, mas, naquela madrugada, estava diferente. Então reuniu todos nós e pediu para levar o necessário e disse que iríamos sair da cidade. Eu já sabia tudo o que estava acontecendo.

Lembro-me daquele alvorecer, com as pessoas histéricas saindo de suas casas ou tentando preencher qualquer tipo de entrada com tábuas e pregos. O meu pai utilizou sua velha picape e disse que iríamos ver um lugar seguro para todos nós. Não existia nada além de mim, minha mãe e a minha irmã mais nova. Naquela tempestade de confusão, nós teríamos que dirigir até uma certa parte da estrada e caminhar a pé, para as montanhas. Lá dentro, existe uma cabana, e ele disse que ficaria tudo bem. Naquela madrugada perturbada, eu não percebi ostentando armas de grosso calibre junto com alguns produtos em conserva no porta-malas. Então, papai olhou nos meus olhos, foi uma das poucas vezes que demonstrou emoção ao afirmar que eu seria o responsável por tudo depois dele.

Ele me ensinou a usar armas na primeira semana, disse tudo que eu precisava para caçar e identificar plantas silvestres, essas que poderiam ser consumidas pelo homem. Esse mesmo período a minha irmã estava começando a ficar com gripe, com tosse e febre alta. Lembro quando trancou ela no quarto de cima, usou uma lei pessoal para proibir a mamãe de chegar próximo. Eu não precisava estar perto para saber que ela parecia piorar cada dia mais. Até que uma certa madrugada, nós ouvimos um barulho de arma dentro da cabana. Levantei do meu quarto, enquanto estava ouvindo a mamãe chorando e ele com os seus velhos panos cobrindo o rosto e mandando eu me deitar... Continuava com seu rosto quadriculado igual a personagens de quadrinhos, a mesma aparência que sempre teve enquanto os seus olhos estavam embaixo de um sembrante macabro; a mesma expressão que sempre teve quando passava uma ordem e era tudo que eu precisava para obedecer ao pé da letra.

O ressoar da arma foi tudo que eu precisava para saber que o coronavírus, e o que todos falavam no passado, chegou ao nosso lugar isolado. Ele tentou mostrar como se fosse um quadro negro rabiscado, a doença foi a causa de tudo. Acho que apenas estava entendendo o básico, mas todos estavam confusos. Naquele dia, ele olhou para nós dois: a mamãe nos pedaços e eu, sempre sério... Sinceramente, não conseguiria demonstrar nenhum tipo de remorso porque tudo parecia um vazio para ser preenchido aos poucos. Lembro quando fez parecer que não havia matado a minha irmã e disse que uma gripe não seria como nós estávamos habituados, o comportamento humano era apenas uma fachada para a coisa medonha que estava se escondendo dentro das pessoas. Recordo da minha mãe afundando-se cada vez mais em prantos, o papai parecendo cada vez mais frio, contudo, eu sei que estava sendo atormentado pelo sofrimento. Naquele dia, eu, simplesmente, observei sem saber qual emoção escolher. Só sei que o disparo de arma está saltando por todos os cômodos da nossa residência, um barulho incessante no meio da floresta e se escondendo dentro das tábuas do nosso lar.

Na maior parte do tempo, nós estávamos caçando. Creio que ficamos vários dias, talvez um ano ou dois, sozinhos na mata. Nessas ocasiões, ele tentava recordar das notícias enquanto ficava tentando materializar seus últimos momentos ouvindo um rádio velho, que transmitia freneticamente as notícias que estavam acontecendo por todo o mundo. Como se fosse um castigo, não existia nenhum barulho além do chacoalhar das árvores, e o papai repetia as palavras como se estivesse lembrando como uma fotografia as notícias falando sobre o tal vírus, que cada vez mais estava ganhando mutações e afetando as pessoas. Na maioria das ocasiões, que estávamos explorando a mata, ele tentava me passar o que vivenciou antes que tudo acontecesse: as pessoas se transformando, o comportamento explosivo e a doença se espalhando. No início não percebi, mas ele estava apenas me preparando.

Parecia que todos os nossos dias se resumiam a isso. Porém, em uma tarde, nada foi o que nós aguardávamos... Achei que seria apenas nós três isolados, até que, em uma dessas trilhas, enquanto eu estava procurando alguns cogumelos comestíveis, eles praticamente apareceram do nada, observando-me como fantasmas... Era um homem não muito velho, uma mulher com o rosto baixo e as costas curvadas para frente, praticamente os seus braços estavam mortos, caídos do lado do seu corpo sem vida. O cara segurava uma criança de colo coberta por trapos. Então, eu percebi os seus olhos desesperados enquanto tentava falar. Fazia tanto tempo que eu não me comunicava com ninguém, com exceção da mamãe e o meu pai, como eu já falei: quando era necessário. Só sei que naqueles segundos, em que eu estava vislumbrando aquelas pessoas, não sabia o que dizer.

O homem tentou comunicar-se. A sua voz parecia estar em um quarto fechado por conta do som estranho que fazia, a dificuldade que ele tentava falar causava calafrios. O movimento do seu rosto de uma forma muito rápida e, as vezes, ficava com o seu vocabulário lento. No mesmo instante, eu observei a mulher com cicatrizes negras se espalhando por todo o corpo e a criança nos braços dele, movimentando-se freneticamente para apenas um bebê. Não tinha como, eu sei que não. Então, naquele mesmo momento que aquelas pessoas tentavam falar comigo, eu ouvi o meu pai dizendo atrás de mim: conhecia muito bem o seu rifle enquanto ele estava puxando o gatilho.

"Não se mexa, garoto!" - sei que foi a primeira vez que o papai falou grosso comigo, mas deu para perceber que sua voz estava tão assustada quanto eu. Fiquei parado, mas captei que os dois adultos iriam fazer um movimento brusco. Na minha mente apenas existe uma opção, e eu abracei ela ao jogar o meu corpo deitado no chão. Um disparo arremessou a mulher, de forma que caiu girando. O homem cuspiu um líquido negro no chão e foi atingido logo em seguida por um outro disparo na sua testa. A criança, nos seus braços, caiu próximo de mim, e eu tentei afasta-me, porém o meu corpo estava com dificuldades para obedecer. Naquele momento, senti os braços grossos do meu pai puxando minha camisa para mais afastado, e o papai tentava tampar o seu nariz com a mão enquanto observava criança no chão de mais perto. O bebê não estava chorando, apesar disso encontrava-se em cinesia com aqueles movimentos assustadores para apenas um corpo tão pequeno. Eu fechei os meus olhos quando ouvi o terceiro disparo de arma.

Naquela mesma noite, lembro-me dos meus progenitores conversando freneticamente, mencionando que mais cedo ou mais tarde eles chegaram aqui. O pai dizendo que não sabia como as vítimas do coronavírus estavam indo tão longe. Naturalmente, eu não consegui dormir e fiquei ouvindo a madrugada toda o mesmo assunto e o quanto as pessoas seriam perigosas. Naquele momento, ele criou uma lei para que nós não nos aproximassemos de ninguém e, qualquer tipo de aproximação de invasores, poderíamos atirar. Foram dias mais agitados do que o normal, pois até a mamãe estava aprendendo a manusear uma arma de fogo.

Eu já não sabia quanto o tempo estava passando, mas sei que já havia uns meses que os outros apareceram. Quando as coisas pareciam se acalmar, fomos surpreendidos mais uma vez. Relembro quando levantei em uma manhã em que o sol ainda não havia aparecido, todavia, já estava claro o suficiente para enxergar os cômodos dentro da cabana, e o meu pai tremendo segurando o rifle. Repetiu cada vez estrondando mais as paredes com seu berro autoritário para alguém parar. Então, finalmente, segurando a minha própria arma, eu vi a mamãe diferente...

Os seus olhos estavam alarmados, ela parecia tentar falar e sua boca não obedecia. O seu corpo se movimentando de forma grotesca, não consigo esquecer o gemido de agonia... sei que a mamãe estava sofrendo cada segundo que os seus membros se aproximavam de nós próximos da porta. A sensação foi quase a mesma daquele dia que nós encontramos outras pessoas. Recordo muito bem do aberto no meu peito, agora mais deteriorante de quando eu soube que a minha irmã foi morta. Quando finalmente ele se calou, e ela estava próxima suficiente, o disparo de arma silenciou o lugar novamente. Quando ela caiu, deu para perceber que engoliu o cuspe que esteve naqueles segundos acumulando na sua boca.

Suas últimas palavras, enquanto ele estava pisando suas botas de couro pesadas para próximo do seu corpo, foram necessárias para assombrar nós dois até hoje: "Ninguém está salvo, nem mesmo a nossa família... Por favor, dispare logo!" Um líquido preto começou a percorrer o seu rosto até o pescoço, saindo da sua boca. A sua maneira de respirar era como se estivesse uma sacola plástica enrolada pelo seu rosto. Ele não pediu para eu sair quando tirou sua camisa, enrolou em volta do seu nariz e boca, e apontou a arma no rosto dela. Eu podia ver o seu rosto com tanta clareza...

Quando eu perdi a minha irmã e a mãe, sentia-me cada vez mais sozinho dentro do velho barraco. Os nossos momentos de caça, por exemplo, foram divididas em um intervalo de dois dias para um e outro sair para a mata. Eu já havia crescido o suficiente para saber lidar com a floresta e os perigos em todas as partes. Algumas vezes, vi outras vítimas do coronavírus perdidas no bosque com aquele comportamento anormal, mas, na maioria das vezes, tentava evitar algum tipo de confronto, ao imaginar que mais cedo ou mais tarde o papai encontraria um deles e mataria logo em seguida. Às vezes, nós ficávamos até dois dias para tentar encontrar o que comer, dado que nem sempre raízes e frutas conseguiram manter os nossos corpos fortes para mais uma luta. Quem saiu com a intenção de capturar algum animal foi ele. Eu esperaria que durasse pelo menos dias fora, mas nem ficou dez horas para voltar novamente.

O alerta das latas, presas em algumas árvores, despertaram-me devidamente armado e apontando o rifle de caça pela janela. Era o papai, as suas roupas foram as primeiras coisas que eu conheci, mas o seu comportamento não era o mesmo. Nunca tropeçou nas próprias latas, que foram colocadas para alarmar qualquer tipo de movimento do lado de fora. Achei que estivesse ferido por conta da dificuldade que estava arrastando os seus pés, mas não, não mesmo. A dez metros de distâncias, perguntei para o papai se estava tudo bem. Percebi os seus lábios quando tentava falar, e ele tentou obedecer automaticamente. O seu gemido era enjoativo em cada momento que arriscava se pronunciar, suas respostas estavam lentas demais. O mais próximo que chegava era de uma criança empenhando-se para soletrar, como se tentasse aprender a comunicasse comigo pela primeira vez. Quase no mesmo momento, a sua cabeça começou a movimentar de forma exagerada e a sincronia do seu corpo parecia entrar em um curto-circuito de gestos involuntários.

E, naquele momento, eu sabia o que fazer, o meu dedo estava pronto e eu não podia hesitar mais nenhum segundo. Um estalo abafado silenciou mais uma vez aquele momento, e ele cambaleou duas vezes até caí.

Autor: Sinistro

21/03/2020

A poesia do inferno

Como vim parar aqui?
Nessa terra destruída
"Tem alguém aí?"
E ninguém me respondia

Andei um pouco adiante
E vi uma coisa interessante
Uma lança ensanguentada
Que ainda pingava

E lembrei que eu havia morrido
Que deus me mandou pra cá
"Como não havia pensado nisso?"
Ele disse:
"Te mandarei ao inferno, e lá será seu novo lar!"

Aqui é muto quente
Cheio de bichos e gente
Esse lugar é esquisito
Para sobreviver cometemos canibalismo
Mas viver de carne humana é impossível
Que ser humano sobreviveria nesse lugar horrível?

Vários locais com diversas pessoas
Umas más outras loucas e poucas boas
Cada vez que morremos aqui
Nascemos em um casulo de carne que ninguém consegue invadir
Cada vez nascemos em um local diferente
Sobrevive aquele que é mais inteligente
Nem o mais forte sobrevive nesse lugar
Ou morrerá desnutrido ou alguém lhe devorará

Por isso seja uma boa pessoa
Antes que você morra
É melhor mil pessoas ajudar
Do que aqui em baixo ficar
Ouço uma voz de repente
Olha só! Irei morrer novamente!

O inferno é o lugar para até o mais forte cair
E cada morte o diabo ri
Aqui é cheio de escuridão
E também tem aquela garota com o cão
Aquele cachorro de três cabeças
Com diversos simbolos na testa parecendo que veio da seita
Você pode fugir e até correr
Mas por todo o inferno ela irá encontrar você
É só isso, apenas um aviso
Que com muitos pecados você corre perigo.

Voltarei a minha rotina
Comer gente e cometer chacina
Olha só ali a frente vejo uma pessoa correndo
Tchau, irei jantar! Mais tarde nos encontraremos
Nesse lugar manchado de sangue
Sombrio com gritos aterrorizantes.

Autor: Chigahan

19/03/2020

Papai Está Triste Hoje

Ele nem sempre é assim.
Papai estava bravo ontem.
Ele não gosta quando a mamãe fala com Greg, nosso vizinho.
Mamãe estava falando com ele.
Papai chegou em casa com uma garrafa cerveja.
Papai e mamãe foram conversar no quarto.
Eu estava trancada no meu...
É meio difícil de ouvir mas, eu pude escutar mamãe chorando, ouvi também um barulho de vidro quebrando, alguns grunidos,talvez seja uma brincadeira, algum tempo depois não ouvi mais nada, papai saiu do quarto, ele se sentou em sua cadeira e foi assistir o jogo, ele me mandou não sair do quarto até amanhã.

Faz tempo que a mamãe não sai do quart.o
Papai não me deixa entrar.
Quando eu peço ele apenas briga muito.
Ele nem sempre foi assim, só quando ele bebe.
Papai estava no quarto da mamãe, ele saiu mas esqueceu a porta aberta.
Eu olhei para dentro, mamãe estava dormindo no chão.
Eu entrei e tinha um cheiro horrível, tipo quando papai pega um cervo e esquece de botar no freezer...
O carpete do quarto estava manchado.
Acho que mamãe estava bebendo vinho.
Papai chegou.
Dava pra sentir o cheiro forte de bebida vindo dele.
Papai estava triste hoje.
Ele nem gritou comigo.
Apenas mandou eu ir para o jardim.
Papai pegou seu rifle de caça.
Vamos caçar aqui? Eu perguntei.
Ele apenas pediu para eu olhar as flores.
Ele estava atrás de mim.
Aquelas rosas estavam tão belas.
Mamãe ama as tulipas do Jardim.


Autora: ChloeAescrota

18/03/2020

Não sei por que ele não para de sorrir para mim

Recebi aquela correspondência avisando sobre o falecimento da minha avó. Nunca tive contato com ela, com exceção da época em que ainda morava na sua casa junto com a mamãe. Depois disso, nós nunca mais nos falamos. Ouvi boatos de pessoas próximas mencionando que ela estava cada vez ficando pior com os seus problemas, já não sabia mais quem era ninguém e o seu quadro clínico era ficar na maior parte do tempo internada.

Sinceramente, nunca tive motivos para choramingar, pois eu já havia perdido os meus pais tão cedo e me tornei um adulto acostumado com esses tipos de tragédias na família. É claro que levei em consideração que em seu falecimento era uma velha com seus quase oitenta anos, certamente viveu o suficiente. Bem, voltando ao assunto, eu havia recebido a correspondência falando sobre sua morte e eu precisava voltar para minha cidade de infância com o objetivo de assinar alguns documentos. Ela não deixou nada além da sua velha e grande casa, foi a única coisa que ganhei em toda minha vida.

A nostalgia bateu forte enquanto eu estava carregando uma mochila pesada no meu ombro direito e observando os bairros, o parque onde brincava com meu melhor amigo, as casas as quais estão todas destruídas pelo tempo, tudo parece diferente e, da mesma forma que eu envelheci, parece que tudo decaiu junto com o passado. Com certeza não foi difícil encontrar a decrépita casa da vovó, o seu quintal com aquelas duas árvores grandes ganhava destaque por causa do tamanho com um casarão para um bairro tão pobre. Estive navegando em meus pensamentos por alguns minutos, caminhando e me aproximando até que observei para a moradia da frente... Toda minha atenção foi roubada para o que eu estava olhando.

As pessoas estavam com roupas pretas, amontoadas e algumas no quintal, senhoras e senhores, conversas solenes e murmuradas. De repente, senti uma sensação estranha, aquele mesmo sentimento quando você começa a achar que toda a ardência do seu corpo foi roubada por um sentimento de gelo anavalhado. Foi estranho, desde o momento que ignorei o meu objetivo e aproximei-me mais um pouco da moradia, como se não quisesse nada. Percebi, próximo da porta de entrada, um caixão pequeno. Considerei, comigo mesmo, se poderia aproximar mais, porém não desejei causar nenhum tipo de irritação para aquelas pessoas que não me conheciam na região. Enquanto estava dobrando os meus pés para sair, observei uma criança aparecendo no meio da multidão e aproximando-se de mim.

Aparentemente, ignorado, quase como uma penumbra no meio daquela multidão, ele foi arrastando-se entre os pés e foi aproximando da minha direção. Desenhou no rosto um olhar curioso e espantado. Dei alguns passos para trás, incomodado com a figura daquele garoto estranho, olhando para mim. Finalmente parou, reparou com mais atenção e deu um sorriso... mesmo com aparência triste, ele estava rindo. Fui distanciando e observando aquele menino olhando em minha direção com o mesmo sorriso no rosto até que eu entrei na casa, após forçar a chave umas três vezes para que a fechadura velha abrisse e me tranquei.

Foi uma sensação inquietante e desconfortante. O mesmo calafrio, desde que pisei no meu bairro de infância, parece me perseguir. Coloquei lenhas na chaminé e usei casacos, mas não consigo parar de sentir a mesma abominação de frio extremo. A casa estava empoeirada, móveis coloniais. O sentimento de melancolia ficou ainda maior quando olhei para as escadas, os quartos e suas portas. Apesar do tempo, recordei a época em que chegava do colégio com os meus amigos para brincar, o meu melhor amigo se escondendo dentro dos cômodos e eu o procurando. Os momentos bons de infância parecem que foram as únicas coisas boas que sobraram.

Mais tarde, saí para encontrar algum lugar para que eu possa comer. Já havia dormido no sofá por causa da viagem e a fome veio feroz, rosnando no meu estômago e doendo. Não me preocupei em trancar a porta, lembro muito bem das pessoas desse bairro, mesmo que aparentando ser um estranho na vizinhança, sei que ninguém aqui ousaria entrar na minha casa com intenções de roubar ou fazer mal.

Minha atenção voltou para aquela mesma residência, que estava em luto por causa de um velório, tudo parecia calmo como se nada estivesse acontecido: porta trancada e janelas fechadas. Fiquei aliviado quando percebi que aquele garoto não estava observando e sorrindo. Então, voltei minha concentração para frente e me assustei como se fosse um fantasma: ele me esperando na esquina, examinando e o sorriso sendo rasgado no seu rosto. Tentei ignorar, indo para outra calçada, e ele não desviou os olhos da minha pessoa. Dessa vez acenou e, por alguma razão, eu senti um desconforto, algo semelhante com medo. Apressei os meus passos para o mais longe possível.

Aquela silhueta encontrava-se lá, ainda parada. Mesmo fitando de relance, eu poderia contar cada fileira de dentes, ostentando todos e, assustadoramente, movimentando a sua mão esquerda. Não tive como me alimentar normalmente, esse lugar estava corroendo-me como ferrugem em um ferro. Uma opção para ficar em um hotel foi descartada, uma vez que não tinha grana para esse conforto. Meu único desejo, enquanto tentava empurrar aquele sanduíche na boca, era de resolver o mais rápido possível a venda da casa. Um bairro bom, um casarão antigo e bem conservado, não seria difícil encontrar alguma família jovem interessada. Foi o que o rapaz disse que trabalha com vendas de imóveis.

Ao entardecer e durante à noite, parecia que aquele garoto sempre estava olhando e rasgando sua boca em duas direções, eu poderia jurar nas esquinas, mal-iluminadas, que ele estava esperando. Para dormir não foi fácil na primeira noite, pois carreguei uma sensação de apreensão. O meu coração sempre parecia estar rápido demais ou acordava no meio da pândega com figuras pequenas correndo, na verdade, era apenas uma, como se fosse uma assombração. Já havia passado três dias e eu estava sendo sufocado por uma coisa que não consigo explicar, e a droga do frio, não importando o horário do dia ou a localidade que eu me encontrasse, piorava e sempre permaneceu grudado em mim desde o maldito momento que encostei nessa região.

Estou sentada em uma cadeira na cozinha, o meu corpo tenta se curvar para encontrar conforto na mesa e o café, já morno no momento, parece tentador, mas o meu ânimo diz para ignorar. Velhos hábitos de antigamente estavam voltando, da mesma forma que as lembranças aparecendo uma seguida da outra, quando eu fiz parte desse lugar no meu momento de infância. Aquele mesmo sentimento de que quando nós éramos mais novos e nunca aproveitamos o melhor ápice da nossa vida, desaparece em cada direção que eu vejo. O telefone tocou, depois de um bilhão de anos sem ficar perdendo a linha com a internet, era o sujeito que estava negociando minha casa. Nesse momento degradador, ele disse que finalmente encontrou um comprador, um cara que almejava transformar esse lugar em um imenso comércio.

Fiquei aliviado, mas aquela mesma sensação e o tormento daquele garoto estava sempre me observando, sorrindo e roubando o meu sossego. Consumindo e quebrando o meu restrito subconsciente, deixei o meu próprio ego para um objetivo, procurar e visitar uma casa que não ficava nada além de alguns passos do meu gramado. Era grande, morto e seco, contudo, de alguma forma, parecia vivo. Encostei na porta, bati algumas vezes com o meu indicador e ouvi os ferrões sendo abertos, de cima para baixo, uma segurança incomum para um lugar tão pacífico e remoto.

As minhas mãos estavam guardadas no casaco, da melhor forma para fugir do sentimento de clima abaixo de zero, o gorro na minha cabeça acomodava os meus cabelos grisalhos. Então, nesse momento, vi a presença da senhora... aparentando ser uma bruxa. Examinei os seus traços da aparência, desgastada, alguém que fazia muito tempo que não dormia e, certamente, dando o dane-se para o seu visual. Os seus olhos de julgamento pareciam me conhecer. Em tal caso, ela foi direto ao ponto, perguntando o que eu desejava e questionei sobre o garoto que alguns dias atrás estava sendo sepultado em um infortúnio de conhecidos, dentro de uma caixa triste, com pessoas figurando fantasmas e, naquele amanhecer, utilizando roupas deprimidas em um clima nublado.

"Não preciso de condolências. Diz logo o que você deseja. Já imagino que seja parente da velha senhora esquecida e abandonada na outra casa. Ninguém nunca apareceu para cuidar nos seus momentos de solidão e devorada pela sua doença. Expulse imediatamente o que você faz aqui, rapaz!?" - Todas as suas palavras parecem ser emolduradas em cada verbo da sua voz seca, consumindo-me e despedaçando em cada sensação vergonhosa por sentir culpa por tudo aquilo.

Não sabia o que revidar, muito menos falar sobre seu comportamento. Alguém da sua família, que morreu há alguns dias, foi minha curiosidade esquecida como uma escuridão sendo apagada por uma luz. Entre nós dois, a pavorosa mulher preparou-se para trancar a porta. Nesse momento, olhou para trás, em cima dos seus ombros, e disse o nome de uma criança... Eu fiquei travado, imaginando dezenas de coisas. Logo aquela figura misteriosa surgiu, aquele mesmo sorridente e observador, que sempre esteve olhando e rasgando os seus lábios na minha figura. Dessa vez triste e calado, a figura cortante na sua face desapareceu como uma rachadura, fragmentada em mil pedaços. Então, ela deu um tapa no seu pescoço, de trás para frente.

Quanto mais o garoto tentava parecer, encontrando uma esperança infantil, ao enfrentar o autoritarismo da sua mãe, foi sendo apagado como um borrão. A velha pavorosa, empurrou contra a parede e aponta o dedo no nariz do garoto, esmagando a felicidade em seu rosto de alguns dias atrás. Os dentes brancos foram desaparecendo, em um buraco pequeno e redondo, nos seus lábios, deixando escapar lágrimas no seu rosto e ela empurrou uma Bíblia no meio do seu peito, pedindo para ele rezar e dizendo que era um pecador.

A única coisa que eu poderia fazer era observar, os meus pés ficaram enraizados nas tábuas dessa casa, ainda mais deteriorada do que a minha da velha e falecida avó. Depois daqueles segundos infinitos, ela aproximou-se e pediu para eu desaparecer, mas o garoto deslizou tão rápido quanto um vento, em uma porta entre aberta.

"Estou com saudades de você, Christopher, por que não brinca mais comigo?" - Não sabia se eu estava mais impressionado da forma que tratou o garotinho, como se fosse um verme, ou ele falando aquele nome, referindo-se a mim. O meu corpo ficou ainda mais preso naquele lugar, como se fosse cimento em estado petrificado.

"Você sabe muito bem que esperou por muitos anos, mas o senhor sumiu! Depois daquilo e, agora, ele está feliz contigo e lhe acompanhando em todos os lugares. Por que não olha para trás...? Observe o Christopher que agora mesmo está animado e tentando chamar sua atenção!" - Rapidamente, a porta foi trancada, e eu pude ouvir agressões contra o garotinho, palavras religiosas o julgavam. Nessa ocasião, lembrei do meu melhor amigo de infância, que havia morrido poucos dias antes de eu sair desse lugar. Não tinha como aquele garoto saber o seu nome, não consigo olhar para trás sem sentir um abalo de presença nas minhas costas. Eu não quero lhe ver novamente, muito menos lembrar que fui responsável por empurrar, afogando-lhe naquele rio...

Autor: Sinistro

07/03/2020

A Origem de Netium

A alguns anos atrás em uma cidadezinha simples do interior, vivia um pobre garotinho chamado Robert. Sua vida não era uma das melhores afinal, sua família não era daquelas famílias perfeitas que comemoram datas festivas abraçadas no calor de uma lareira acesa, não, era uma família separada que sempre estava em conflito, gerando brigas e brigas diariamente. Não era fácil para Robert.

Devido aos conflitos diários que aconteciam na casa do garoto, Robert se tornou uma criança quieta e tímida, um pouco desconfiada porém curiosa e suas curiosidades sempre chocavam de frente com as regras de seu pai que acabava batendo nele por quebrar as regras. Robert odiava seu pai, ele não era do tipo que saía 6 horas da manhã de casa pra ir pro trabalho, na verdade era um vagabundo que ficava em casa o dia todo apenas reclamando de tudo... sua mãe também não podia reclamar muito, ela tinha também tinha seus defeitos porém nem se comparavam ao ódio que Robert sentia pelo seu pai.

Um dia, o pai do garoto chegou em casa bêbado, uh que novidade, ele mal conseguia ficar em pé porém, a sua fúria e decepção com a família, principalmente com o filho eram claramente visíveis a quilômetros de distância. Ele imediatamente começa a agredir a mãe do garoto. Robert em um ataque de fúria e ódio decide dar uma investida contra seu pai, sem sucesso afinal ele era apenas uma criança de 10 anos, o pai acabou desviando sua atenção da mãe para o garoto e começou a espancar-lo.

Quando a agressão finalmente acaba, o pai sai de casa e some pelas ruas escuras da cidadezinha. Robert estava desmaiado no chão e sua mãe logo o pega e coloca em sua cama e começa a cuidar dele chorando ao seu lado pedindo desculpas por não ser forte e ser uma boa mãe. Quando o garoto finalmente desperta ele se lembra de tudo o que havia acontecido, ele começa a chorar e começa a desejar que tudo fosse melhor, que sua vida fosse melhor, que ele pudesse viver um dia feliz, um dia verdadeiramente feliz afinal, a única felicidade que ele conhecia era ver as outras crianças felizes no parquinho da cidade.

Todos os sentimentos de ódio, vingança, rancor, raiva, desespero e tristeza iam crescendo dentro de seu interior, ele nunca sequer descontava ou desabafava esses sentimentos pois se o mesmo fizesse isso, provavelmente iria apanhar novamente. Então, desesperado com a sua vida de merda, Robert foge de casa debaixo de chuva sem direção, sem rumo, disposto a acabar com todo aquele sofrimento, ele não aguentava mais um segundo naquele inferno.

Instintivamente, ele corre para o parquinho, lá era o único lugar que ele conseguia ver outras crianças felizes, ele desejava ter aquilo mas sempre era interrompido por seu pai ou as vezes até pela sua própria mãe que dizia que ele não precisava daquilo. Era um fria noite chuvosa, ele não conseguia enxergar mais que um palmo a sua frente, mas ele consegue reconhecer o parque por causa dos brinquedos e por conta de algumas luzes que se mantinham acessas nos postes. Ele vai até a ponte que ficava por cima de um lago, ele senta na beirada da ponte e começa a pensar em sua miserável vida e em como ela poderia ser melhor, em como ele poderia ser feliz e, em como ele poderia se safar dessa pra quem sabe, uma nova vida bem melhor que essa, não custava tentar!

Naquele momento passavam milhares de ideias por sua cabeça, eram ideias perfeitas de como seria viver num paraíso, ser rico, ter carros, ter tudo aquilo que um ser humano poderia ter, ou até mesmo ser um super herói com incríveis poderes, até que uma ideia mais racional veio a sua cabeça, o suicídio. Robert acha que essa é a melhor opção pois assim ele não iria mais ter que sofrer neste mundo, e que provavelmente ele renasceria em uma vida bem melhor que está e também, o afogamento seria a melhor opção já que ele não sabia nadar.

Robert se joga da ponte do parquinho caindo diretamente no lago, ele sente o contato de seu corpo molhado devido a forte chuva com a água congelante do parque, seu corpo havia afundando demais no lago e como ele não sabia nadar, Robert não teria chances algumas de voltar a superfície. Ele rapidamente prende a sua respiração tentando aguentar o máximo de tempo possível debaixo d'água, coitado mal sabia ele que na maioria das vezes um ser humano não treinado consegue segurar o ar debaixo d'água por apenas 30 segundos ou no máximo 90 segundos.

O ar começa a faltar em seus pulmões e logo Robert começa a ficar desesperado por ar, seu corpo quer ar, sua mente quer ar, seu espírito queria ar; o arrependimento agora era maior do que todos os seus sentimentos de ódio e indiferença porém, não havia mais volta, não havia mais como ele conseguir nadar até a superfície. Robert agora achava que a ideia de se afogar foi na verdade uma péssima ideia, ele daria qualquer coisa para voltar no tempo, mas não havia mais jeito seu arrependimento era simplesmente enorme...

Desesperado ele começa a se debater e tenta subir a superfície de qualquer jeito para conseguir respirar porém, o pobre coitado não sabia nadar, ele estava tomado pelo pânico e cada vez mais rápido seu coração estava batendo, ele não aguentou mais segurar o ar e começou a tentar respirar instintivamente debaixo d'água mas, obviamente que isso não deu certo, a água entrava em seu corpo piorando ainda mais a situação, Robert naquele momento chorava arrependido desejando voltar para os braços quentes de sua mãe pelo menos uma última vez até que de repente, tudo se acalmou, tudo ficou tão visível, tudo ao seu redor estava tão silencioso, lentamente Robert via a sua visão escurecendo, escurecendo até que finalmente tudo se escureceu por completo...

Alguns anos depois :

Se passado alguns anos, Robert agora era um adolescente de 16 anos, ele e sua mãe acabaram de se mudar para uma novo bairro, dessa vez era um bairro grande muito mais urbanizado e movimentado, os sons dos veículos poderiam ser ouvidos a grandes distâncias. A mãe de Robert finalmente tinha conseguido um pouco de paz com o divórcio após descobrir que estava sendo traída pelo marido com várias prostitutas bom, pelo menos agora eles estavam livre das agressões daquele maldito, ou não…



Robert agora estava em um novo ambiente, um novo lar, uma nova escola, novos amigos, bom tudo era novo, tudo estava perfeito de mais, finalmente a felicidade estava reinando sobre sua vida. Porém, chega o primeiro dia de aula, as suas espectativas eram altas, ele achava que teria aulas normais com pessoas normais e talvez tentando socializar com ele, quem sabe Robert não poderia se encaixar em algum grupo de estudantes? Bom, acontece que na verdade, não foi bem assim...

O primeiro dia de aula foi um verdadeiro inferno, Robert não tinha conseguido fazer nenhuma amizade e ninguém fazia questão de conversar com ele, na verdade todos o ignoravam e o achavam estranho devido as suas roupas nada convencionais, além do fato de que ele era tímido e novato. Este seu visual humilde e tímido iria fazer com que Robert fosse atormentado pelo resto do dia por alguns valentões que se achavam os donos da escola. Seu ódio estava crescendo cada vez mais a cada hora que ele ficava naquele inferno até que finalmente a hora de ir embora, chegou…

Algumas semanas se passaram e a sua vida escolar continuava o mesmo inferno de sempre porém agora, Robert tinha conseguido fazer alguns amigos, ele finalmente estava socializando até que enfim uma luz surge no meio daquele lugar. Robert odiava a escola, porém ele só havia duas escolhas, ou ele estudava ali ou voltava a morar com seu pai, já que sua mãe não seria capaz de sustentar o filho e a si mesma dentro de casa, a economia era tudo pra eles.

Robert estava fazendo alguns desenhos em seu caderno no canto da sala, até que Kevin, um dos valentões entra na sala e mira seu olhar em sua direção, Robert já sabia que aquele idiota iria vir encher o seu saco, seu ódio por ele era imenso, tudo em Kevin era odioso, seu penteado era odioso, seu rosto era odioso, seu corpo era odioso, até mesmo aquele maldito sorriso sarcástico era extremamente odioso para ele, seu ódio pelas coisas em geral era enorme.

O otário se aproximou de Robert e começou a ver os seus desenhos e logo ele começa a criticar-los com um tom sarcástico :

- Eu posso fazer melhor do que esse lixo que você chama de desenhos.

Apesar de sua voz ser extremamente irritante e odiosa, Robert da de ombros e volta a passar o lápis pelo caderno.

- Você me ouviu? Eu estou falando com você, seu bosta!

Kevin inesperadamente pega o caderno de Robert rasgando todas as folhas possíveis. Robert se levanta da mesa rapidamente para pegar o caderno e é quando Kevin joga o caderno para longe e vê seus amigos chegando por trás dele.

- O que é que você vai fazer? Uh? Diz Kevin de nariz empinado.

Robert não diz uma palavra e senta em seu lugar baixando sua cabeça, ele esperava que todos aqueles idiotas vão embora para os seus lugares. E milagrosamente sim, eles voltaram para seus lugares, Robert agradece por eles não terem ficados ali por mais tempo. Ele se levanta para recuperar seu caderno de desenhos que estava jogado no chão até que de repente, uma moça pega o caderno e lhe entrega.

- Obrigado! - Diz Robert sem olhar para garota.

- De nada. Ei eu me chamo Mhäry e você deve ser o…

Um silêncio toma conta do lugar, Robert estava de cabeça baixa pensando em como poderia se livrar daqueles idiotas até que de repente.

- Ei eu estou falando com você, me responda, como você se chama? - Ela diz com um tom de autoridade.

- A sim, me desculpe é que eu estava, eu estava é sei lá. Meu nome é Robert.

- Bonito seu nome, você está bem? Eu vi que Kevin estava tentando te humilhar.

- Tá tudo bem, eu estou bem, isso não foi nada…

Robert naquele momento estava querendo fugir dela, ele não estava nenhum pouco afim de conversar, muito pelo o contrário dela que fazia cadê vez mais e mais perguntas, ela inclusive chegou a sentar do seu lado só para saber mais sobre sua vida e contar coisas aleatórias.

Com o passar do tempo, Robert e Mhäry estavam namorando. Robert a amava, a amava de mais, ele poderia dar a sua própria vida por ela, bom isso era o que ele sempre dizia pra ela, ele contava todos os seus segredos para Mhäry, inclusive aqueles segredos mais ocultos em sua mente, como as suas tristes memórias da infância onde sua vida realmente não era uma das melhores e de sua tentativa fracassada de suicídio.

O namoro causou um certo ciúmes em Kevin que ainda sofria provocações de seus amigos. Inicialmente Kevin gostava da garota, porém ela o odiava por ele ser muito chato e exibido além de que ele sempre fazia muitas coisas sem graças na tentativa de conquistar-la e isso a irritava demais, a relação entre Robert e Mhäry logo gerou ciúmes em Kevin que agora jurava que iria inferniza-lo pelo resto de sua vida…

Numa fria manhã de terça feira, Robert vai até a escola, ele logo percebe que sua namorada não iria aquele dia, "droga hoje o dia será horrível!" Pensava Robert, na verdade ele só ia na escola para vê-la.

Estranhamente aquele dia ia muito bem, Kevin e os outros valentões não foram encher o saco de Robert em nenhum momento, nem na hora da entrada, na troca de professores e no recreio, na verdade tudo ia bem aquele dia, bem até de mais para ser verdade. Robert logo desconfiava que alguma coisa muito ruim iria acontecer até que ele sente repentinamente e sem avisos um ódio poderoso queimando por todo o seu corpo. Ele não sabia da onde via esse ódio e porque ele apareceu em um dia tão calmo e tranquilo, até aquele momento…

Na hora da saída, novamente o ódio estava queimando por seu corpo, Robert estava suando, ele tira sua blusa de frio azul e quando ele ia colocar ela na bolsa, ele sente um arrepio em sua espinha e logo em seguida escuta passos vindo rapidamente em sua direção, ele logo se vira se da de cara com Kevin e seus dois amigos, Ronnie e James.

Não entendendo nada do que estava acontecendo e achando que alguma coisa acontecia atrás dele, Robert vira a cabeça para o outro lado porém, ele não vê nada então ele virá novamente para o lado dos garotos para vê-los e inesperadamente ele leva um soco de Kevin na cara fazendo com que ele caísse no chão.

- Você não me parece tão valente quando a sua namoradinha não está por perto. Diz Kevin dando risadas sarcásticas.

- Vamos pegar ele. Diz James.

Robert tenta se levantar mas é impedido por Ronnie que segura as suas pernas fortemente e então James e Kevin pulam encima de Robert dando vários golpes em sequência ao longo de seu corpo, vários pontapés e pisões na cara, no estômago e nas pernas. Kevin furioso pega Robert pela camisa o deixando frente a sua cara dizendo :

- Isso é por você ter pegado a MINHA mina. Diz Kevin furioso.

Kevin cospe na cara de Robert e o joga contra o tambor de lixo que estava na calçada, Ronnie e James rasgam as sacolas de lixo derrubando tudo no pobre garoto que agoniza de dor no chão dando várias risadas de sua situação. Após a fúria passar Kevin logo olha arrependido para Robert pedindo desculpas em sua mente, eles ouvem uma sirene, um dos vizinhos havia presenciado a briga e chamado a polícia. Os três garotos fogem sem prestar socorro deixando Robert naquela situação humilhante…

Robert é levado para o hospital com vários hematomas pelo corpo, algumas costelas quebradas, ferimentos na cabeça, nas mãos e nas pernas. Ele estava novamente com ódio, ele estava explodindo de ódio, até que uma voz rouca e profunda diz :

- Você deve me libertar. Eu já te ajudei uma vez, eu posso te ajudar outra vez Robert.

Logo o ódio desapareceu e em seu lugar, a tristeza apareceu, kágrimas se formam nos olhos de Robert e elas começam a escorrer por seu rosto, ele estava surpreso por ouvir aquela voz misteriosa…

- Eu não posso. Diz Robert soluçando.

- Você sabe o que acontece quando você coloca um copo vazio debaixo de uma torneira aberta?

- O que? Diz Robert confuso.

- O copo começa a se encher de água, e se você não fechar a torneira, a água irá transbordar do copo. Sabe o que isso significa?

- Me deixa em paz! Grita Robert com raiva em suas palavras.

- Significa que uma hora eu irei ter controle sobre você, eu irei ter controle sobre você e aí, eu poderei te proteger, eu poderei cumprir a nossa vingança, a nossa promessa, você não pode fugir de mim, lembre-se disso, Você Não Pode Fugir de Mim, Robert. Diz a voz misteriosa dando gargalhadas maliciosas que ecoavam na cabeça de Robert.

Tentando parar o som insuportável das vozes, Robert tapa seus ouvidos rolando pela cama, ele acaba caindo no chão agonizando de dor gritando pedindo para parar até que de repente, Mhäry e sua mãe entram no quarto junto de alguns médicos e enfermeiros que pegam o garoto colocando-o na cama novamente e lhe dando alguns medicamentos para que ele pudesse voltar a dormir, novamente…

Quando ele finalmente acorda, Robert está tonto numa cama de hospital, ele olha ao seu redor porém tudo estava embaçado no entanto, ele consegue ver uma silhueta de uma pessoa, ele força seus olhos para conseguir enxergar melhor e sem querer ele acaba derrubando a bandeja que estava em seu colo acordando a pessoa que estava ali.

- Robert? Você está bem, você já acordou? Diz Mhäry.

- Mhäry você está aqui? Minha visão está embaçada não consigo te ver. Responde Robert.

- Sim eu estou aqui, sua mãe teve que voltar pro trabalho e me disse para ficar aqui com você, você quer que eu chame algum médico?. Diz Mhäry preocupada

- O que? Eu não sei… Diz Robert completamente confuso.

Inesperadamente dois policiais e um médico entram no quarto, eles pedem para que Mhäry saia do lugar, relutante ela sai da sala esperando pelo lado de fora.

- Olá Robert, somos da polícia e queremos fazer algumas perguntas pra você, está de acordo a colaborar? Diz um dos policiais.

- Sim eu acho. Diz Robert ainda um pouco confuso.

- Sabemos que ocorreu uma briga entre você e mais três garotos em horário de saída escolar. Poderia nos dizer o motivo da briga e quem eram os garotos?

- Na verdade esses três desgraçados vem pegando no meu pé desde quando eu cheguei nessa cidade, eu odeio eles, eu os odeio, EU OS ODEIO! Grita Robert furiosamente para os policiais.

- Por favor mantenha a calma, quem são os três garotos? Diz um dos policiais surpreso.

- James, Ronnie, e Kevin. Diz Robert com desgosto cerrando os dentes e fechando os punhos.

Neste momento o policial fica em silêncio por um tempo, aparentemente surpreso com os nomes e então ele diz :

- Obrigado pela cooperação, tenha um bom dia. Diz um dos policiais saindo da sala.

Assim que eles saem, Mhäry logo em seguida entra na sala pulando encima da cama de Robert o abraçando e fazendo várias perguntas como sempre…

Depois de finalmente se recuperar dos ferimentos, bom nem todos os ferimentos mas a maioria, Robert finalmente retornava a sua casa, sua mãe o recebe carinhosamente e preocupada pergunta do se está tudo bem e se ela poderia ajudá-lo em alguma coisa, Robert diz que sim…

Ao retornar para a escola, Robert agora estava muito mais agressivo e impaciente, seus sentimentos negativos que ele guardava por tanto tempo parecia estar agora escapando por entre as pequenas frechas de sua mente e isso sempre acabava o colocando em situações de conflitos, ele não tinha paciência nem mesmo para sua namorada… o ódio reinava sobre ele.

Quando ele cruzou o portão da escola e lançou seu olhar ao longe na multidão esperando encontrar Mhäry, ele a vê porém, um cara estava tentando beija-la, ela estava tentando fugir dele mas ele era mais forte, até que finalmente ele consegue beija-la. Essa cena fez com que Robert paralisa-se, ele estava tremendo da cabeça aos pés, ele não expressava nenhuma reação ele não sentia nada, nem raiva ou ciúmes, apenas um vazio, um vazio infinito e mortal, extremamente mortal, esse vazio era o seu ódio…

Robert apenas da meia volta e sai da escola.

Alguns dias depois :

Depois de descobrir sobre a vida daquele maldito desgraçado, Robert analisa-vá o momento perfeito para o ataque, era uma fria noite de terça -feira, ele sabia que no dia seguinte, só haveria James, um dos colegas de Kevin em sua casa, pois seu pai estava viajando por causa do trabalho e a mãe dele iria trabalhar.

Era a oportunidade perfeita, ele não sabia ao certo o que iria fazer quando chegasse lá, Robert poderia simplesmente bater nele ou xingar-lo ou até mesmo sei lá, milhares de pensamento vieram a cabeça de Robert repentinamente tudo se acalmou e aquele mesma voz misteriosa do hospital diz :

- Vá para a cozinha, na última gaveta existe uma faca, preta!

Robert sem ter controle de seu corpo vai até cozinha obedecendo todas as instruções e abri a última gaveta e para o seu espanto realmente havia uma faca de cabo preto lá, ele não sabia como a voz sabia que a faca estava lá, mas olhando para a faca, Robert reparou que a ela estava com o cabo quebrado, então ele diz :

- A faca está quebrada.

- Está é perfeita.

Quando Robert pega a faca, uma forte energia queima sobre seu corpo subindo de seus pés até a cabeça, um ódio poderoso tomou conta de seu corpo e ao mesmo tempo milhares de flash vieram instantaneamente em sua mente mas um acabou chamando mais a atenção de Robert, o dia em que ele tentou cometer suicídio...

Robert pensava :

"Aquele dia foi o pior dá minha vida, meu pai como de costume havia chegado bêbado em casa e acabou brigando com minha mãe e comigo, ele acabou me batendo, eu tentei revidar mas eu era somente uma criança indefesa de 8 ou 9 anos naquela época e meus golpes não surtiram efeito então cansado de toda aquela tortura, eu decidi fugi de casa naquela mesma noite no meio dá chuva com lágrimas escorrendo pelo rosto correndo sem rumo pelas ruas até que eu cheguei no parquinho dá cidade".

"O parquinho da cidade era um lugar agradável, particularmente eu nunca pensei que iria acabar tirando minha vida naquele lugar tão doce… eu estava andando nele aproveitando meus últimos momentos de vida até que eu encontrei uma ponte que passava por cima de um lago, eu pensei em me jogar de lá na esperança de morrer afogado já que eu não sabia nadar, naquele momento nada me importava, realmente nada me importava... mas quando eu iria pular, tudo se escureceu e de repente eu volto a realidade".

Voltando a realidade com os olhos cheios de lágrimas, Robert estava mergulhado em ódio e com sede de vingança, ele realmente estava disposto a matar aquele desgraçado que ele era obrigado a chamar de pai, era como se todos os seus sentimentos tivessem sido substituídos por ódio...

- Nada irá me parar, nada irá me parar, nem meu pai, nem Kevin, nem James, nem Ronnie, nem a polícia e nem mesmo Deus, ninguém irá me parar! Diz Robert maliciosamente soltando tendo um ataque de risos.

No dia seguinte ele não foi a escola, Robert estava planejando o que eu iria fazer com James. Robert queria muito dar uma lição naquele idiota pra ele aprender a não mexer com a namorada dos outros. Fazia planos A e B para caso alguma coisa desse errado e então repentinamente ele teve uma brilhante ideia, depois de ter feito os prós e contras desta idéia, Robert vê que seria muito mais vantajoso realiza-la.

Quando finalmente chegou a hora de colocar o plano em prática, Robert pega o carro "emprestado" dá sua mãe e vai até a casa de James, eram duas dá tarde, Robert já estava suando devido ao calor, o sol estava de matar. Para a sua sorte não havia nenhum movimento na rua tudo estava estranhamente tão quieto sem nenhum movimento então, ele decide agir.

Ele toca a campainha dizendo que era um amigo dele e que tinha ido ver ele, James logo abre o portão e toma um surpresa, Robert percebe o quão surpreso James estava por vê-lo, James realmente não esperava que ele, logo ele fosse fazer uma "visitinha" a sua casa logo o namorado da mina que ele estava tentando pegar...

Antes que James pudesse reagir de alguma forma, Robert começa a lançar vários insultos, com todas as palavras que vinham em sua mente até que de repente, a visão de Robert se escurece e por puro impulso ele acerta um um soco em seu nariz fazendo com que James desmaia-se. Quando Robert volta ao normal, ele estava em estado de choque, James havia desmaiado e sangue estava escorrendo por todos os lados, oh não droga! Robert realmente não queria tudo terminasse daquele jeito, ele havia perdido o controle da situação, nada disso havia sido planejado anteriormente...

Sem saber o que fazer com o corpo desmaiado, milhares de pensamentos vieram em sua cabeça. Robert podia deixar-lo ali caído mas, mais tarde ele acordaria e me acusaria pelo ocorrido e seu pai era um dos policiais que havia ido fazer perguntas para Robert, agora ele finalmente entende o porquê do policial ter ficado surpreso ao ter mencionado o nome dos garotos. Robert não queria levar a culpa pois ele provavelmente teria que aguentar ficar levando sermão da minha família, e provavelmente iria para uma cadeia de menores ou o pior, sua namorada terminar o namoro devido ao meu ciúmes sei lá e suas ações idiotas...

Desesperado ele olha para trás em busca de alguma resposta e vê o carro da sua mãe ali estacionado então ele olha para cima e não vê mais o sol, na verdade nuvens negras pairavam pelos céus, iria chover... De repente aquela voz novamente surge e diz :

- Você sabe o que acontece quando você coloca um copo vazio debaixo de uma torneira aberta?

- Me deixa em paz seu filho duma puta, você já não me irritou o suficiente caralho? Grita Robert furioso e cansado da voz.

- O que acontece? Exatamente o que eu disse, uma hora a água irá transbordar do copo, e os seus sentimentos de ódio estão transbordando de você.

Arrependido Robert diz :

- Eu não queira que isso terminasse assim…

- Pegue o corpo e coloque no porta malas, rápido parece que vai chover. Diz a voz maliciosamente.

Aproveitando a falta de movimento na rua, Robert pego o pesado corpo desmaiado de James e o joga no porta malas, droga ele ainda continua sangrando Robert não sabia que podia bater tão forte assim… na verdade era a primeira vez que ele tinha agredido alguém desta maneira, aconteceu tudo tão de repente que ele não teve tempo nem mesmo de ver a cena.. Robert entra no carro colocando as mãos no volante olhando seriamente para o nada e pensando no que tinha acabado de fazer, e no que ele iria fazer, e agora? E se aquele policial o encontrasse, e se alguém tivesse visto o seu ato no mínimo estranho e se logo a família de James desse falta dele, Robert tinha que fazer alguma coisa a respeito do corpo dele…

Robert dirigi por um bom tempo sem rumo dando várias voltas em quarteirões aleatórios apenas pensando no que iria fazer com o corpo de James, o tempo se formava para chuva e os primeiros trovões podiam ser ouvidos até que finalmente ele chega a conclusão que o melhor a se fazer era com que James fosse morto… na verdade ele não havia pensado em mata-lo inicialmente, e esse pensamento foi uma sugestão da voz... Robert para o carro numa rua abandonada quase no fim da cidade de frente com uma casa abandonada de madeira, bem antiga pelo visto. Esta casa logo traz algumas memórias da infância de Robert.

Memórias de Robert :

"Eu acabei me jogando da ponte do parquinho e lentamente toda a minha vida passou diante dos meus olhos, os momentos felizes, os momentos tristes, tudo o que eu podia me lembrar de minha vida foi passado em uma fração de segundos que parecia mais uma eternidade até que eu senti o contato de meus cabelos com a água e logo em seguida todo o meu corpo mergulhou, eu comecei a afundar e afundar cada vez mais e não tinha esperanças de voltar a superfície tão cedo, a água entrava em meus pulmões e meu corpo ficava cada vez mais desesperado por ar, eu comecei a me debater feito louco e desesperado por ar, porém eu não sabia nadar então era inútil eu lutar, afinal eu havia decidido isso..."

"Tudo foi se escurecendo o ambiente ficava cada vez mais calmo, tão calmo, tão silencioso, eu não conseguia ouvir nem mesmo os pingos dá forte chuva batendo contra o lago, eu estava ficando fraco até que de repente tudo se escureceu por completo, pronto a minha hora finalmente havia chegado."

"Quando eu acordei, estava deitado numa cama dura e velha em um lugar completamente escuro vazio mas estranhamente eu conseguia enxergar no escuro porém, eu sabia que estava de noite, eu não sei como sabia, eu apenas sabia… o ambiente estava em um tom de cinza depressivo mas eu não sabia que lugar era aquele, o medo e a paranoia logo tomam conta do meu corpo e então eu me lembro da minha última memória.

"Eu havia tentado se matar então, eu estava morto? Realmente existia vida após a morte? Eu estava então no inferno? Que lugar que é esse? Eu achava que o inferno tivesse tom mais avermelhado... Bom talvez eu não estivesse no inferno e sim na Fazenda Negra, bom se isso for realmente a vida após a morte eu estou seriamente decepcionado e arrependido…"

"Logo eu vejo uma luz estranha vindo do andar de baixo, eu decido ir lá investigar o que era, desci as escadas, degrau por degrau cuidadosamente para não fazer nenhum barulho. Quando finalmente cheguei no final da escada eu vejo que estou em uma casa abandonada, mas o que? Como eu vim parar aqui? Exausto eu sentei na cadeira apoiando os cotovelos na mesa e então eu reparei que nela havia algumas fotografias, eu as peguei cuidadosamente para ver-las, apesar da escuridão eu conseguia ver todos os detalhes das fotografias perfeitamente e então percebi que na verdade as fotos eram minhas, tinha fotos minhas correndo, de quando eu era criança, eu indo para escola, eu com minha mãe, eu com meu pai…, eu no parquinho, espera, essa última foto… eu estava no parquinho da cidade, segundos antes de me jogar, mas o que esta acontecendo aqui? Que lugar é este?"

"Então de repente antes que eu pudesse pensar numa resposta, eu escutei passos vindo do andar superior onde eu havia despertado, porém não eram passos de uma pessoa normal, parecia algo muito mais pesado e ameaçador, eu dou um pulo me levantando rapidamente da mesa e corro para porta tentando abrir-la para fugir, porém estava trancada, "maldição!" desesperado eu começo a força-la e tento arromba-la, os passos estão ficando cada vez mais próximos, e mais altos eu começo a ver as sombras da criatura na escada, tomado pelo desespero eu dei um grito e me joguei contra a porta com todas as minhas forças e antes que houvesse o contato com a porta, uma forte luz cai diante de meus olhos me fazendo despertar daquela terrível lembrança..."

Voltando a realidade :

Robert descobre o que era aquela luz que acabara de cair, era um raio que tinha caído bem na frente do carro, por sorte ele não havia o atingido.

Os céus estava completamente nublado com nuvens negras, estava trovejando meu deus, como o tempo pode mudar tão depressa assim? E para o total desespero de Robert, começou a chover, ele tinha medo de água... Devido ao fato dele quase ter morrido afogado, Robert acabou pegando trauma por água, não importava se era uma chuvinha, ou um tsunami, ele morria de medo de água...

Robert estava paralisado dentro do carro com medo de abrir a porta, ele sabia que tinha que esconder o corpo de James no porão daquela casa abandonada, mas estava chovendo, ele poderia simplesmente esperar a chuva parar porém até lá era muito provável que James acordasse.. a chuva começa a ficar cada vez mais forte mais grossa, o cheiro de terra molhada entope o nariz de Robert e sem escolhas, ele decide enfrentar o seu medo…

Robert abre a porta do carro e sente os grossos pingos de chuva em seus braços e pernas, ele logo se arrepia e estremece com medo de que aquilo se repetisse novamente, mas ele sabia que não podia ser pego, ele deveria enfrentar o seu medo, ele deveria ser forte…

Robert desce do carro em meio a forte chuva tremendo de medo e com todos os sentidos aguçados, ele demora até chegar o porta malas e então ele abre o porta-malas e lá estava ele, esse maldito que havia causado tantos problemas… Robert pega o corpo de James e começa a arrasta-lo para dentro da casa tremendo de medo e de frio, mesmo que a casa trazia memórias terríveis de sua infância, lá era o melhor lugar a se esconder um corpo afinal, ninguém iria passa pela aquela rua.

Quando ele chega perto da porta, um ar gélido e penetrante toca a sua nuca, era um pressentimento horrível de que ele não deveria jamais abrir aquela porta, na verdade algo o dizia isso e dessa vez ele poderia afirmar que isso não vinha daquela voz, na verdade fazia até um certo tempo que ela não aparecia, mas infelizmente ele decidiu abrir aquela porta, foi até então a pior decisão de Robert em 16 anos de vida, ainda pior do que ter tentando se matar quando criança…

Ao tocar na maçaneta, seus dedos congelaram instantaneamente e uma forte preocupação tomou conta de sua mente, suas veias estavam pulsando fortemente, sua respiração estava ofegante e agora aquela sensação de que ele não deveria abrir aquela porta estava praticamente gritando sobre ele, era como se uma espécie de anjo da guarda estava berrando "não faça isso, por favor!". Mas ignorando os avisos, Robert abre a porta de uma vez.

Quando ele olho a casa, era exatamente a mesma casa de sua lembrança, as mesmas paredes, as mesmas escadarias, a mesma mesa e cadeiras, nada havia saído do lugar, tudo estava idêntico a sua lembrança inclusive as fotografias estavam sobre a mesma… Antes que Robert pudesse pensar em alguma coisa, ele sente um forte puxão no braço, olhando para baixo, Robert vê que James estava acordado e tentava se soltar.

Robert jamais deixaria James escapar, afinal ele havia chegado longe de mais para desistir agora e não poderia deixar ele foder ainda mais a sua vida então em uma onda de impulso, Robert pisoteia James várias e várias vezes até que ele começou a cuspir sangue, mas isso não era o suficiente para Robert naquela hora o ódio havia tomado conta de sua alma, naquele momento ele não queria mata-lo, muito pelo contrário, Robert queria faze-lo sofrer, sofrer pelas suas próprias mãos e descontar tudo aquilo que ele havia passado por ele na escola e acima de tudo, aprender que ninguém mexe com Mhäry

Depois de ter pisoteado James, Robert começa a arrasta-lo agressivamente pela sala até o porão, ele abre a porta e desce as escadas fazendo com que James batesse a cabeça várias vezes nos degraus, mas isso pouco importava para Robert, ou talvez não. Ele estava sorrindo de orelha a orelha, era impossível não sorrir naquela situação doentia, Robert dava várias gargalhadas incontrolavelmente e então, ele amarra as mãos e os pés de James numa mesa que havia no porão e começa a andar pela sala procurando algo que nem mesmo ele sabia o que era.

Até que então ele bate o pé em alguma coisa no chão, Robert se agacha e vê que ele tinha chutado um machado, ok incrível agora por que haveria um machado num lugar como esse? Bem quem se importa? Robert iria usar-lo contra James com um enorme prazer, sorrindo de oreia a oreia.

Ele pega o machado e lentamente arrasta ele pelo chão até chegar perto da mesa onde James estava amarrado, Robert preparava o golpe mas, ele percebe que James não estava conseguindo enxergar nada, mas como? Estava tudo tão claro tão nítido para Robert. Robert dá uma machadada em sua perna e logo em seguida um grito muito alto pode ser ouvido, ele continua repetidamente dando vários golpes pelo corpo incontrolavelmente e James continuava gritando, Robert nunca havia se sentido tão bem quanto aquele dia, ele estava com o coração acelerado suando e sorrindo sem parar, ele queria mais, ele queria mais.

Mesmo apesar de estranhamente estar sentindo prazer em ve-lo sofrer, Robert não queria que James morresse agora tão cedo, afinal qual seria a graça de morrer rapidamente? Ele nem sequer havia pagado pelo seus crimes. Ele deveria pagar pelo o que fez! Repentinamente Robert larga o machado jogando ele no chão, ele começa a andar pela casa procurando outra coisa para utilizar como ferramenta, ele avista um armário no final da sala e decidi ir até lá ver o que tinha nas gavetas. Aquele era o dia de sorte de Robert, tudo estava indo tão bem, e pra sua sorte e para o azar de James, havia um alicate de pressão na gaveta…

Robert pega o alicate e saltitando alegremente vai até James que estava completamente mutilado, com pedaços de carne vermelha espalhados pelo seu corpo, ele agonizava de dor e implorava com todo o seu perdão para que ele parasse, sem chances disso acontecer…

- Acho que peguei pesado de mais com você, James, bom provavelmente você não tem muito tempo de vida então eu, você já fez as unhas hoje? Diz Robert empolgado.

Ele pega o alicate aplicando contra as unhas dele e então, fazendo força Robert puxa a unha do dedo indicador de James, ele grita de dor e começa a se debater desesperadamente, lágrimas começam a escorrer pelo seus olhos, seus gritos são insuportáveis porém abafados pelo isolado porão e pela forte chuva lá fora.

Robert puxa uma unha de cada vez, a cada vez que ele puxava uma unha, mais James se debatia desesperadamente implorando por misericórdia e pedindo perdão não entendendo o que ele havia feito para merecer tudo aquilo até que, seus gritos estavam irritando Robert então, ele enfia um pano de chão na boca de James para que ele pudesse continuar com o, "o meu pequeno crime", como ele chamava o seu primeiro assassinato.

Na gaveta daquele mesmo armário, havia outras ferramentas, provavelmente quem morava nessa casa gostava de concertar coisas… Robert pega um martelo e começa a martelar os dedos da mão de James que já estavam doloridos, ele martela até que não sobra mais nada dos dedos a não ser uma carne moída vermelha. aquilo era incrível para Robert, ele começou a rir novamente desta vez descontroladamente não conseguindo nem mesmo mais ficar de pé, seu estômago doía, sua boca estava cansada de tanto rir e sorrir até que repentinamente ele para de rir e o silêncio toma conta do ambiente.

Robert olha para James, ele estava morto, uau! Por quanto tempo ele estava ali rindo daquela situação doentia? Seus pensamentos mudaram de um segundo para outro, ele olha para as suas mãos cobertas por um líquido cinza escuro e gosmento e diz :

- O que foi que eu fiz? Eu me tornei um monstro assassino, meu deus, o que foi que eu fiz?

- E agora? O que foi que aconteceu? Como isso foi acontecer?

- O que está acontecendo comigo?

- A água transbordou…

Autor: Suspeito